segunda-feira, 29 de agosto de 2022

Resenha #250 Afrofuturismo: O Futuro é nosso! Vol 2 (Aisameque Nguenge, Alexandre Diniz, Anderson Lima e Israel Neto)


"Afrofuturismo: O Futuro é nosso. Volume 2" da Kitembo Editorial é a sequência que, tal qual o primeiro livro, reunir contos de autores negros que abordem o afrofuturismo. Ainda que não haja nenhuma obrigação dos contos serem FC, nesta edição todos são deste gênero. Basicamente tudo nesta edição está melhor que na anterior. O visual, de forma geral, está mais bonito. Além da ilustração da capa estar sensacional, também há gravuras que abrem e encerram cada um dos cinco contos. A diagramação com detalhes em tema ciber ficou muito agradável. Quanto ao conteúdo literário, temos uma coleção melhor. A decisão editorial de manter poucos contos, considero acertada. Enfim, agora vamos falar sobre os contos individualmente.

Te encontro no futuro (Kinaya) Aya é uma trabalhadora em uma cidade virtual, com estrutura fechada, onde os jovens são mandados de bem cedo para trabalharem sem contato social além do ambiente de trabalho. Então, em uma noite solitária, numa caminhada noturna Aya encontra um jovem que parece saber mais sobre o lado de fora. O conto abre bem a antologia, com um bom mistério desenvolvendo o mundo e ação para concluir o conto.

Como a gente (Junno Sena) Abidemi e Dandara são duas exploradoras espaciais em uma de muitas  missões exploratórias para encontrar um novo lar para a humanidade. Eles estão acompanhadas de Migu31, um robô androide, que as intriga e assusta devido ao sua curiosidade. Gostei como o autor desenvolveu tanto as astronautas como o robô, criando a tensão necessária para validar o final. Meu conto preferido da antologia. 

O último racista (Mateus Domont Fadigas) O detetive Motumbi está no encalço d'O Ariano, um perigoso terrorista que difunde discurso racista pela internet, até que é convocado para investigar a morte de um homem branco e envolvendo seus amigos de infância, Dandara, perseguida pelo Ariano e Kaio, nas investigações. Mistério bem trabalhado em tão poucas páginas e gostei como a tecnologia influi na trama de forma consistente. Muito bom!

A lua em minha palma (Sarah Aniceto) Ayo é uma demibot que devido a sua personalidade livre e inconstante não consegue encontrar sua função na sociedade e acaba fugindo na sua busca por significado. Conto muito bonito e singelo, principalmente pelo carisma da protagonista.

Aye Kekere: A cidade do futuro (Marcello Souza) A ambientação da cidade de Aye Kekere e a motivação do protagonista lembram bastante o clássico A Cidade e as Estrelas, de Arthur C. Clarke, porém com a pegada afrofuturista e um desfecho singelo e bonito.


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terça-feira, 23 de agosto de 2022

Resenha #249 Olhos de Pixel (Lucas Mota)


"Olhos de Pixel" de Lucas Mota foi lançado pela Plutão Livros, uma editora focada em livros digitais. É uma aventura cyberpunk que se passa nas ruas de uma Curitiba num futuro próximo. É uma abordagem do cyberpunk amplamente diferente do introspectivo e intimista Diário Simulado de Delson Neto (também pela Plutão Livros), partindo para a aventura frenética usando e abusando da estética dos jogos eletrônicos, quase numa paródia ao cyberpunk oitentista. 

Acompanhamos Valentina Santeless, conhecida como Nina. Uma root, uma fora da lei que aceita trabalhos perigosos e duvidosos para descolar uma grana para buscar uma vida nova para ela e seu filho na colônia Chang'e. Junto com a temperamental Iza e o valente Tera, vão travar uma verdadeira guerra pela própria liberdade, após terem sido pegas pela polícia privada e terem que pagar capturando o Kalango, um terrorista que sabe dos segredinhos sujos da Igreja de Salomão. Entidade que controla a cidade com mãos de ferro e impõe um conservadorismo religioso que caça lésbicas como Nina e transexuais como Tera. Em certos momentos acompanhamos Lídia, a policial que tenta usar os roots para prender o Kalango.

O livro tem um ritmo alucinante, recheado de cenas de ação, que só não vai divertir quem não quer. Contudo, temos uma preocupação em colocar ideias tecnológicas interessantes, retiradas de jogos. Um processo coerente com a gamificação do trabalho que vemos hoje. Por exemplo, as smartselfs, que são apetrechos que aparentemente apenas servem para inserir programas utilitários mas que na mão dos hackers são modificados com modpacks que implementam melhorias nos sentidos e na força física dos usuários com o risco de superaquecimento e reboot - que deixa o usuário desacordado por algumas horas. Podemos imaginar que sofrer um reboot, em meio aos intensos combates que nossos roots se submetem enquanto estão arriscando-se para fechar seus trabalhos, é uma morte quase certa. Quando lemos esses sistema em ação durante o livro, temos algo fácil de visualizar, acompanhar e torcer pelos protagonistas.

Isso acontece porque também houve uma preocupação em dar mais camadas a Nina, pois ela teve atitudes condenáveis em relação ao seu filho e precisa arcar com as consequências, como podemos ver nesta história. Lidia Gaber, também foi bem trabalhada no seu dilema, uma vez que a narrativa em terceira pessoa a acompanha em suas reviravoltas. O resultado de tudo isso junto é um livro que não tem medo de dizer a que veio. Duro e sem meias palavras, Olhos de Pixel mete o pé na porta assim como nas suas cenas de ação! Recomendado!   




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segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Resenha #248 Contos de Outrora, d'As Crônicas de Kérdar (Eduardo Alós)


"Contos de Outrora" de Eduardo Alós é uma pequena coleção de contos de Fantasia ambientados no mundo de Kérdar, o mesmo o romance "As Crônicas de Kérdar: A espada do dragão e os dragões vermelhos". Os contos exploram momentos antes do início do livro, revelando algumas origens e dando protagonismo a personagens secundários. É interessante como este conjunto de histórias funciona tanto quando lidos antes do romance (uma prévia do que esperar deste mundo, sem comprometer o romance) quanto depois (pois aprofunda alguns personagens secundários).

Nordhal e o tesouro de Hedlund acompanha um grupo de pescadores que, influenciados por um velho persuasivo, partem em busca de um tesouro numa ilha que ninguém parece saber a localização. Conhecemos Rekdal e a entidade que sabe o futuro, além dos que viriam a ser os donos do mercado de Udveske, que entrarão na trama do primeiro livro das Cronicas de Kerdar. É basicamente uma historia de piratas com tudo que queremos ver neste tipo de história, principalmente ação e maldições!

Em Thern e o Torneio de Verão conhecemos como o chefe da guarda de Sydlige chega ao seu posto e como a linha entre o sucesso e o fracasso é tênue. Além desta reflexão, podemos vislumbrar o reino dos humanos em uma época de paz, com suas estruturas sociais que são uma boa introdução ao primeiro romance. O torneio é bastante divertido de acompanhar e as cenas de ação bem conduzidas.

A Perdição de Álfheim nos leva até o Reino dos Elfos onde vemos que uma pequena fagulha de tragédia pode desencadear outras tragédias ainda piores. Além de conhecermos as origens de alguns personagens e as motivações de outros, temos o lado melancólico de um reino que aparenta ter sempre a sabedoria necessária para ser eternamente feliz mas nada é sempre tão feliz assim. 

A Senhora da Floresta acompanha uma menina que ao descobrir a verdade sobre sua mãe biológica tenta quebrar a maldição que persegue sua linhagem e ao mesmo tempo tenta viver ao lado de seu amado mesmo contra a vontade de todos. Novamente temos uma tragédia no sentido clássico do termo. Vale acompanhar este drama até o fim.






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segunda-feira, 8 de agosto de 2022

Resenha #247 O bebê em Netuno (Clare Winger Harris)


"O bebê em Netuno" de Clare Winger Harris é uma das histórias da autora que surgiu nas antigas revistas pulp dos anos 1920 nos Estados Unidos e que está sendo celebrada pela editora Cyberus com vários lançamentos de contos na Amazon. Este é um dos contos que foram lançados e o segundo da autora resenhado aqui.

Em O bebê em Netuno acompanhamos dois pesquisadores que conseguem estabelecer comunicações com vida em Netuno porém o tempo corre de maneira extremamente lenta para os netunianos o que faz com que as comunicações demorem bastante. Então uma expedição é formada para ir até o planeta para travar contato pessoalmente. Os protagonistas descobrem que além de seu tempo passar de forma muito rápida, não são vistos a olho nu. Quando os cientistas conseguem travar contato visual descobrem que os conterrâneos de Elzar, um cientista netuniano, estão em perigo e cabe apenas aos terráqueos ajudarem. Como muitos contos da era pulp, hoje soam absurdos mas trabalham muito bem com a ciência que tinham na época e, levando isso em consideração é uma história que faz especulações interessantes sobre outras formas de vida senciente tão diversa da humana e a autora conduz muito bem o mistério, com um final bonito e de encher os olhos.
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segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Resenha #246 Afrofuturismo: O futuro é nosso. Vol 1 (Aisameque Nguengue, Alexandre Diniz, Anderson Lima e Israel Neto)


"Afrofuturismo. O futuro é nosso. Volume 1" é uma antologia da Kitembo Editorial. Uma editora dedicada publicar autores negros com histórias afrofuturistas, em formato impresso. Este primeiro volume foi organizado por Aisameque Nguengue, Alexandre Diniz, Anderson Lima e Israel Neto, reunindo cinco contos em um formato pequeno, curto porém muito bonito, caprichando nas ilustrações, na qualidade da diagramação e, no principal, os contos. Achei sempre interessante a opção de publicar menos contos ao invés de colocar o máximo possível apenas para fazer volume. O resultado é uma antologia curta mas muito gostosa de ler.

O livro abre com um texto de apresentação escrito por Eugênio Lima e trás uma reflexão bem embasada e apaixonada sobre o afrofuturismo, fazendo a expectativa sobre o livro aumentar bastante. Temos ainda um prefácio de Lu Ain-Zaila, pioneira na literatura afrofuturista no Brasil. A ilustração da capa e as internas são de Fabrício Flor e Lucimara Penaforte.

Black Looping: a (re)volta do presente (Felipe Augusto) abre a antologia com o conto de maior fôlego. Somos apresentados a Zwi que vive clandestinamente em Nova Ethiopia, mesmo local onde o General Arimbé e o Dr. Mbembe debatem sobre o futuro do país. Então Maria, comenta que seu filme favorito é Nova Ethiopia e entramos de fato na história do conto. Maria vive num futuro onde é comum viagens assistidas no tempo. Prestes a fazer sua primeira viagem rumo a Bahia do nosso tempo, Sueli, a mãe da menina decide acompanhá-la e é nos preparativos da viagem que temos as revelações do conto. Particularmente eu gostei delas porque remetem a um mundo aventuresco que podia ser mais explorado.

A peixeira e a esfinge (Alec Silva) autor que também integra o movimento Sertãopunk traz um conto que se encaixa em ambos os movimentos. Acompanhamos um assassino contratado por um traficante de arte dos povos africanos e da diáspora, para matar uma esfinge que queria proteger os artefatos. O desdobramento é o típico do cyberpunk, mas foi muito bem feito e isso é o que importa em um bom conto.

O caderno de Evee (Alisson Matheus) não costumo gostar de contos muito descritivos, mas este me surpreendeu. A narrativa e ambientação, muito imersiva e passa a sensação dos contos clássicos de passagem do tempo. Evee é uma mulher sobrevivente de uma das colônias, criadas numa reorganização pós-apocalíptica e em nova crise, ambiental e social. Vou deixar um detalhe sobre a personagem para que vocês descubram, pois o autor foi muito sutil. Mesmo sendo um conto, sobre uma personagem contemplativa, ainda guarda uma surpresa no final.

A guerreira Nabliahh: Conquistando a galáxia Mater Constructer (Fernando Gonzaga) conto curto sobre Nabliahh, a líder guerreira de um império galáctico que está nos momentos finais de uma investida a um antigo inimigo. Tem imagens muito bem construídas e interessantes, mas senti falta de um enredo mais elaborado.

Tempestade (Ana Meira) conto sobre uma habitante da cidade de Berten que é abordada por uma misteriosa mulher que a atrai e faz revelações sobre sua origem. Prosa carregada de poesia e alegorias bem construídas. Encerrou bem a antologia!
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