segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Resenha #215 - A Terceira Potência, Perry Rhodan 2 (Clark Darlton)


[As resenhas do blogue não costumam ter spoilers, mas para esta série não teremos esta preocupação. Pois ela será escrita pensando em trocar ideia com os leitores que já leram as obras. Além disso contar o enredo das primeiras histórias não constitui grande prejuízo para quem deseja começar a série, mas de qualquer forma fica o aviso]

Perry Rhodan e mais três oficiais da Força Espacial dos EUA haviam pousado na Lua a bordo da nave Stardust.
Lá encontraram a gigantesca nave espacial dos arcônicas, que tinha realizado um pouso de emergência. Era tripulada pelos representantes de uma grande potência galáctica que, apesar de sua superioridade técnica e científica, estavam em decadência. O cientista-chefe da expedição, um dos poucos que não fora atingido pela total apatia que dominava os tripulantes, padecia de uma enfermidade do sangue que só a medicina terrena podia curar.
Perry Rhodan decide ajudar os arcônidas: retorna à Terra em companhia de Crest, o cientista-chefe e, ao invés de aterrissar em território dos EUA, prefere a solidão do deserto de Gobi a fim de evitar que os avançados conhecimentos arcônidas caiam nas mãos de qualquer potência terrena.
Rhodan tem motivos de sobra para proceder dessa forma. Seus superiores hierárquicos, contudo, veem nele um traidor…

"A Terceira Potência " é o segundo volume dessa série gigantesca que sabemos que começamos e não temos nenhuma perspectiva para terminar. Neste segundo volume Perry Rhodan, começa a colocar em prática seu plano de unificar a terra, objetivando a construção de um grande império galáctico. Notemos a mudança no tom, pois no primeiro volume, Rhodan falava apenas em preparar a humanidade para um universo cheio de raças alienígenas e tecnologia evoluída, através de uma aliança humanidade-arcônidas, e não em um império galáctico.

Apesar de sabermos das intenções do Perry Rhodan e das linhas gerais do plano, não sabemos como ele vai concretizar seus planos. Não acompanhamos os pensamentos de Rhodan, ao contrário do primeiro episódio, o que temos é um foco na humanidade reagindo a sua chegada inesperada. Acompanhamos suas decisões por fora. Entendemos que Rhodan quer consolidar a aliança arcônida-humanidade, para isso precisa evitar a terceira guerra mundial e trazer uma cura para leucemia. A doença que acometeu Crest, como já sabemos desde o episódio anterior.

A ideia de humanidade unida é muito bonita, mas não faz isso sem tomar partido nas rivalidades da Guerra Fria que tanto tenta superar e acaba agarrando-se em alguns vícios anticomunistas. Quando Rhodan é abordado por um general e alguns soldados, da “Federação Asiática”, são feito de palhaços com uma arma antigravitacional, enquanto o general americano é tratado com respeito, mesmo que ambos representem dois lados do mesmo status quo a ser superado.

De uma forma geral, temos um episódio em que os acontecimentos são muito mais acelerados que no episódio anterior. Não há suspense a ser feito em relação aos arcônidas, apenas em relação a uma possível guerra nuclear, mas mesmo esse suspense não tem muito efeito, pois já sabemos que a tecnologia arcônida tem soluções fáceis para evitar o temido holocausto nuclear. Sendo assim, além de acelerado, o episódio tem um tom mais leve, com cenas até engraçadas. O episódio termina com Rhodan conseguindo manter seu acordo com o Arcônida Crest, mas sem conseguir unir a humanidade, mesmo que seja para matar ele mesmo.
Leia Mais ››

segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

Resenha #214 - Silicone XXI (Afredo Sirkis)


"Isso foi o começo, depois ele começou a defender umas ideias loucas sobre eutanásia. Disse que era a favor de eutanásia social, política, cultural e demográfica. Falou um monte de besteiras. (...) Disse que os grandes problemas do Brasil eram o excesso de gente e as eleições, que a gente precisava precisava de um homem forte pra diminuir a população, essas coisas." p.189.

"Silicone XXI" é a obra que inaugura o que veio a ser chamado de Tupinipunk, um subgênero que faz uma releitura brasileira ao Cyberpunk. Santa Clara Poltergeist (Fausto Fawcett) de 1991, Piritas Siderais (1994), de Guilherme Kujawsky e Distrito Federal (Luiz Brás) são outras obras que se encaixam no Tupinipunk, ainda que o próprio autor não visse sua obra como Ficção Científica, ressaltando apenas seu aspecto Policial, sou obrigado a discordar, pois não é a Pistola Laser e os carros flutuantes que tornam a obra uma FC.

Como em um bom romance policial, acompanhamos uma investigação de uma serie de assassinatos, cometidos pelo chamado "Maníaco da Pistola L" e também de "siliconpênis" contra homossexuais. O investigador negro de 52 anos, da polícia metropolitana José Balduino e a jovem Lili Braga, jornalista investigativa de 25 anos, sexualmente liberal, logo chegam ao nome de Estrôncio Luz, major reformado do exército que exige ser chamado de general, que alimenta ideias de eugenia social e limpeza étnica, mas que tenta compensar sua impotência com um pênis de silicone cirurgicamente implantado.

O vilão é, na verdade, uma das mensagens principais do livro, referência a truculência dos militares, ironicamente associado a uma homossexualidade enrustida e a um saudosíssimo, uma vez que o romance (de 1985) se passa em 2019. Estrôncio Luz é uma referência quase direta ao elemento radioativo e ao General Cruz, que exemplificava a truculência dos militares. Retirando a questão atômica, que saiu de pauta após o fim da Guerra Fria e do medo nuclear, e substituindo pela conveniência do Corona vírus, a questão ideológica do saudosismo militar ganha tons quase proféticos, e até otimistas, vide o nosso atual governo que se orgulha de cancelar CPFs. Por outro lado, também temos um futuro pós governos social-democratas, em que iniciativas e comunidades verdes, com respeito ao sincretismo religioso brasileiro, se espalharam pelo país, dando um aspecto utópico ao futuro tecnológico cyberpunk, um vez que o autor é um dos fundadores do Partido Verde e teve ocupou várias vezes seguidas cargos legislativos, até seu falecimento em 2020.

A leitura é muito divertida, uma vez que o autor trata a ironia e irreverência das pornochanchadas, os assuntos sérios e o próprio estilo policial e a enxurrada de termos técnicos do cyberpunk. Infelizmente o livro foi incompreendido, na sua época, recebendo resenhas negativas na época, talvez tenha influenciado a encerrar sua carreira literária. Ironicamente, o publico mais capaz de entender a beleza da obra, é justamente o nicho da FC, gênero negado pelo próprio autor. Espero que essa resenha possa ajudar a promover esse reencontro, entre deste belo exemplo de Ficção Científica Brasileira, com B maiúsculo mesmo, antes tarde do que nunca.
Leia Mais ››

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Resenha #213 - Cyberlogia (Tauã Lima Verdan Rangel Org.)


"Cyberlogia" é uma antologia de contos Cyberpunk. Foi uma boa surpresa em alguns pontos e em outros tem a média comum de antologias. Os pontos fortes são a introdução, que mostra um bom conhecimento sobre o que é o cyberpunk, mesmo sem mencionar as referências e autores consagrados. Os contos bons são muito bons, porém são contos muito curtos. 15 contos em 100 páginas. Alguns contos não se encaixam bem no cyberpunk, e eu esperava um cuidado maior na escolha, uma vez que o livro é curto e a introdução demonstrou conhecimento do tema. 

A Sete Palmos do Chão (Ana Gabriela Pacheco) A divisão social nesse mundo é entre os pobres que moram na superfície e a elite que vive em prédios flutuantes. Acompanhamos uma rebelde que acorda após um atentado a uma fábrica e logo se vê perseguida pela polícia. O conto surpreende no final, por uma resolução aparentemente cansada mas que por alguns detalhes pouco explicados consegue fazer diferente. 

O Roubo de Naguile (Ana Rosa) A humanidade está ameaçada por ter perdido o controle de sua reprodução. Tem mais aproximações com Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, que com o cyberpunk em si, porém é um bom conto.

Éramos Mais Felizes Antes (Clara Formatti) Acompanhamos Maia, que trabalha em um hospital em um futuro de extenso uso de próteses para repor partes orgânicas, quando após um acidente com sua esposa, descobre que ela voltou muito diferente do que ela conhecia. O conto tem uma ideia boa, mas tem uma resolução muito expositiva.

Atualização Mental (Enzo S. Macedo) Júlia é convencida pelos amigos a fazer uma atualização mental, para suprimir sentimentos. Acompanhamos os motivos e as consequências de sua decisão. É um paralelo as fugas diárias que fazemos hoje para nossos problemas. 

A Programação (Fábio Cachamorra) Acompanhamos um Sintético, criado pela IURD (Indústrias Unidas pelo Reino de Deus) em uma analogia muito bem feita entre a ideologia religiosa e a corporativa e a forma como descobrimos é bem explorada.

Cidade Baixa (Fábio Muller) Um mercenário que vive na área privilegiada cai na Cidade Baixa, onde acompanhamos como é a vida lá e a luta do protagonista para sobreviver. Conto digno da ação que promove.

Peças de Reposição (Humberto Lima) Uma linda ruiva dos níveis superiores (dos privilegiados) decide passear pelos níveis inferiores (ultra violentos). Um crime e a vingança, regada a tecnologia robótica. É uma ação clichê como o conto anterior, porém mais esteticamente divertido.

Metallo (Igor Moraes) Mais um conto de robôs, ao estilo Asimov, brincando com as três leis da robótica, que um conto cyberpunk, mas um bom conto de robôs a Asimov, brincando com as três leis da robótica.

Boneca Cibernética (Léon Edson) Um investigador encontra o corpo de uma jovem morta tragicamente, então começa uma torrente de revelações que deixam o conto muito frenético e cheio de ação. Uma pena que o final tenha cara de episódio piloto, ou capítulo, do que um conto fechado.

"Chaos-2120" (M. Consanni) Conto distopico futurista com poucos elementos cyberpunks, mas ainda sim vale a pena forma de escrita na primeira pessoa em forma de relato.

Os Irmãos (Maurício Coelho) Conto típico do cyberpunk, em que dois irmãos pegam um trabalho perigoso, que é mais perigoso que imaginaram. Aqui foi bem ambientado no Pará, o que deu o elemento de nossa relação com a tecnologia.

Drone (Nick Scabello) Acompanhamos Amanda que está fazendo uma incursão em uma área restrita protegida por um drone. Um duelo com a tecnologia, muito bacana de acompanhar. Parece uma cena isolada de um livro, mas consegue ser eficiente como peça isolada, o desfecho traz o motivo para aquele confronto, mas é um conto que vale pelo desenvolvimento. 

Visão (Rodrigo Ortiz Vinholo) Narra em primeira pessoa, um homem que passa a ter visões de uma mulher. O autor consegue montar um suspense sobre o que se trata tudo isso, como se fosse um conto de terror mas que tem um desfecho completamente calcado na tecnologia e condizente com o cyberpunk. Meu conto favorito do livro! 

No Boulevard das Sombras (Tauã Lima Verdan Rangel) Temos a história de uma prostituta que involuntariamente se envolve em uma conspiração envolvendo corporações e espionagem industrial. O conto perde bastante parágrafos em descrições de cenário no início e acaba deixando pouco para detalhar mais o final deixando muito enigmático.

Cabeça Vazia (Wilson Carvalho) Conto sobre robôs que tem mais aproximação com os antigos contos de robôs do Asimov que com o cyberpunk contestador dos anos 80, mas ainda sim, um bom conto sobre robôs.
Leia Mais ››

segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Resenha #212 - Sertãopunk - Histórias de um Nordeste do Amanhã (Alan de Sá, G. G. Diniz, Alec Silva)


"Sertãopunk: Histórias de um nordeste do amanhã" é uma antologia de textos e contos que buscam estabelecer um novo subgênero de ficção científica que reflita o nordeste brasileiro. Os autores começam a antologia com quatro textos curtos que estabelecem com bastante riqueza de detalhes, com muita propriedade e boa argumentação, sobre é o sertãopunk e como se relacionam com o próprio nordeste, com o afrofuturismo e a religiosidade no Brasil. Na sequência, temos dois contos, "Os olhos dos cajueiros" e "Schizophrenia" que servem para ilustrar o que os textos evocam. Tudo isso em um livro de apenas 50 páginas.

O conteúdo do livro me agradou bastante e você termina a leitura dos primeiros textos sabendo de fato do que se trata, porém senti falta de um texto com um apelo mais artístico e emocionado, pois no fim das contas estamos falando de arte. Gostei quando o autor teceu uma crítica ao "Cyberagreste, pois é no contraponto ao que vem sendo feito e não satisfaz, que sentimos a força do propósito de movimento. Outro elemento artístico que senti falta foi uma maior quantidade de contos, pois como disse, tudo isso é sobre arte no fim das contas e apesar de ter gostado dos contos, achei apenas dois contos muito pouco.

O primeiro conto, é uma investigação policial que me agradou bastante pela construção do mundo e pela virada no andamento da investigação. Neste caso, o final em aberto funcionou bem. AO menos é melhor que uma resolução ruim. O segundo conto, "Schizophrenia" é cheio de imagens interessantes mas alguns elementos de construção de mundo ficaram sobrando, apesar de interessantes. Porém o gostinho de "no fim tudo era sonho", apesar de não ser exatamente isso, amargou o conto no final.

No fim das contas, acho o saldo do livro positivo, mas a sensação de que a coisa toda ficou mais na teoria que na prática. Quero ver muito mais histórias ambientadas nesse subgênero!
Leia Mais ››

segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Resenha #211 - Missão Stardust, Perry Rohdan 1 (K. H. Scheer)


[As resenhas do blogue não costumam ter spoilers, mas para esta série não teremos esta preocupação. Pois ela será escrita pensando em trocar ideia com os leitores que já leram as obras. Além disso contar o enredo das primeiras histórias não constitui grande prejuízo para quem deseja começar a série, mas de qualquer forma fica o aviso]

"Missão Stardust" é o primeiro volume do que viria a ser a maior saga da ficção científica, com mais de 3000 volumes já lançados no original, em alemão, e quase 1500 no Brasil. 536 deles, em papel entre os anos 70 e 1991. A série foi continuada pela SSPG editora até meados de 2010 em papel e digital até hoje. Contudo, por maior que a saga seja, o início é sempre o numero um e vamos começar por ele, e quem sabe um dia parear com os lançamentos recentes mas, de qualquer forma, o que vale é o caminho.

O primeiro episódio é Missão Stardust, que podemos dividir em três partes. Na primeira acompanhamos até a página 57 uma viagem até a lua repleta de detalhes. É importante lembrar que o livro foi escrito e lançado na Alemanha, alguns anos antes do voo real da Apolo, e portanto, trata-se de uma especulação com bastante detalhes, relevando as diferenças. Tanto que quando o volume chegou ao Brasil, foi colocado um aviso ao leitor, recomendando que inicia-se a leitura após o relato dessa viagem que terminava na página 57. Contudo, a viagem da Stardust e a da Apolo já são antigas e não vi motivo para não ler e quem gosta de detalhes técnicos vai gostar desta parte.

Na segunda parte temos o contato travado, o primeiro oficial entre a humanidade e os arcônidas. Os arcônidas são retratados como uma raça inteligente, com uma tecnologia muito superior porém que está definhando por falta de "força de vontade". Com a exceção de Crest e Thora, que os recebem, os demais arcônidas são letárgicos, satisfeitos apenas em assistirem "vídeos" em uma tela esférica. A letargia chega a um ponto em que reagem a problemas que colocariam suas vidas em risco. Crest e Thora ainda mantem viva essa chama, se importam com o futuro de seus iguais, contudo são bem diferentes. Crest é um cavalheiro com ares aristocratas e simpatiza com a humanidade, enquanto Thora é impulsiva e repudia os humanos. Rhodan representa nossa humanidade, uma visão de que a humanidade é cheia de vontade de realizar grandes feitos e conquistar o espaço.

É aqui que Perry Rhodan é definido ideologicamente, com uma visão de mundo humanista liberal, sem perder o capitalismo de vista. O humano é o centro de tudo e os arcônidas são um alerta trágico caso os humanos se rendam ao assistencialismo, a dar tudo de mão beijada, sob o custo de estagnação. O medo da estagnação pelo bem estar pleno é um medo do capitalismo. Na terceira parte, Perry Rhodan começa a agir para que a humanidade não perca seu rumo, uma vez que a descoberta de um espaço cósmico cheio de raças e tecnologia inexploradas pela humanidade é a descoberta de sua própria fragilidade. Sua missão é salvar a vida de Crest, que padece de uma doença terminal e que em troca de auxílio, ajudaria Perry Rhodan a acabar com a Guerra Fria.

A Guerra Fria Perry Rhodan, nesse novo cenário, é apenas uma perda de tempo, o que pode ser visto enganosamente como uma visão pacifista pedindo a união da humanidade, é apenas um clamor pela reorganização da Terra para adequar-se a novas ameaças. Por esse motivo, Perry Rhodan, na última frase do livro, remove os emblemas dos Estados Unidos de seu uniforme.

Tem resenha em vídeo desta série que rola no YouTube também. Lá no canal Diário de Anarres:





Leia Mais ››

segunda-feira, 22 de novembro de 2021

Resenha #210 - Senciente Nível 5 (Carol Chiovatto)


O romance Senciente nível 5, de Carol Chiovatto, é um grande exemplo de como a ficção científica brasileira pode trilhar seu caminho em nosso país. Calma. Eu explico, pois pode parecer absurdo como uma space opera que gira em torno de um conflito entre duas potências estelares pode ter alguma coisa a ver com o Brasil, além da nacionalidade da autora.

A história acompanha a capitã Lin, que tem a missão de proteger Teo, um emissário do planeta Lena-Hátia, feito prisioneiro pela Bílgia, uma potência imperialista que se estrutura como uma Universidade. Lin salva Teo em meio a uma invasão do exército Hati (naturais de Lena-Hátia) quando este tenta, traiçoeiramente, executar seu emissário, que também é irmão gêmeo da poderosa Imperatriz. Ambos fogem em uma nave e têm de lidar com uma traição palaciana de Lena-Hátia e também com uma acusação de traição contra a capitã Lin, levantada pela Universidade da Bílgia.

De uma hora pra outra, Teo e Lin, antigos antagonistas, se veem obrigados a uma aliança para descobrirem os motivos do complô que deseja Teo morto. Apesar das diferenças culturais e de temperamento dos dois protagonistas, a aliança parece dar certo. Nesse vaivém, eles são auxiliados pela poderosa IA da Bílgia, chamada Nyx, composta de milhares de unidades de processamento de dados espalhadas por todo o sistema.

A história é ágil, narrada em capítulos curtos por um narrador em terceira pessoa que segue ora os pensamentos de Lin, ora os de Teo. Oferece excelentes cenas de ação e consegue encadear bem as descobertas que vão desvendando a conspiração. Porém, mais do que pelas boas reviravoltas, a obra se destaca pela força de suas revelações.

A Bílgia classifica os seres sencientes do universo em cinco níveis, sendo que apenas os de nível 5 podem entrar na Universidade. Entretanto, os nativos de Lena-Hátia não são considerados empáticos o suficiente para pertencer a essa categoria. Até o dia em que o estudo de uma pesquisadora da Bílgia muda o valor das relações entre as duas potências. Isso acontece quando é descoberta a capacidade empática dos Hatis, ao mesmo tempo em que são revelados os detalhes da política pouco empática promovida pela tecnologia da Bílgia. Nesse ponto temos em Nyx uma personagem que impressiona tanto pelo poder, uma vez que domina a tecnologia de ictorrobôs, que faz dela uma entidade onipresente na Bílgia, quanto pela altíssima capacidade cognitiva e por sua capacidade de interagir com o mundo ao redor.

Diferente das space operas da ficção científica de língua inglesa, Senciente nível 5 não busca mostrar a vastidão dos impérios, que, inchados demais, acabam por ruir. O romance busca, antes, mostrar as forças políticas ativas e guiadas por outros parâmetros que não os estritamente econômicos. A Universidade da Bílgia e o Império de Lena-Hátia brigam por recursos, mas são as características da empatia e da senciência que de fato modelam o destino das potências. Somando isso à escrita ágil da autora e à sua habilidade em vislumbrar outras formas de sociedade, mesmo que não consigam viver em paz, essas qualidades já apontam para um caminho muito próprio para a nossa ficção científica.

Leia Mais ››

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

Resenha #209 As Crônicas de Kérdar: A Espada de Dragão e os Dragões Vermelhos (Eduardo Alós)


"As Crônicas de Kérdar: A Espada do Dragão e os Dragões Vermelhos" é uma obra de fantasia épica de Eduardo Alós, que reúne tudo que uma boa fantasia precisa. Um mundo rico em cenários, seres, magia e guerreiros. É uma obra bastante equilibrada, há bastante personagens mas não demais, há magia mas ela não sobrecarrega tudo a sua volta. Alias o equilíbrio entre ordem e caos é justamente o que mantem o mundo de Kérdar inteiro, e quando uma guerra se anuncia entre Humanos e Elfos, é que o verdadeiro mal desperta para colocar em perigo este mundo mágico e intrigante.

A obra se divide em duas partes, a primeira é sobre a guerra entre homens e elfos, e o estopim é quando o Rei Mistgart sai para caçar e entra dentro do território elfo da Floresta Tharya - onde a caça é proibida pelos elfos - e é confrontado pelo Rei Osrond. Ambos os reis são demasiados orgulhosos para evitarem que um confronto armado entre as guardas. O resultado é um massacre dos humanos que permitiram que o Rei sobrevivesse com uma orelha decepada. Mistgart volta ao Reino de Dragun e convoca todas as províncias humanas para declarar guerra aos elfos que do seu lado faziam o mesmo, apesar da contrariedade da maioria dos súditos, inclusive dos príncipe dos humanos, Lindelöf e dos elfos Erön, que tentam juntar forças para evitar uma guerra. O resultado disso tudo acontece na segunda parte, onde um mal sobrenatural emerge das montanhas na Ilha dos Anões e só pode ser combatido com magia, para restaurar o equilíbrio entre Ordem e Caos.

O leitor mais atento vai notar que "equilíbrio" define bem esta obra. As duas metades do livro são bastante equilibradas. A magia aparece desde o início mas ganha importância e vida no decorrer da obra. Outro trunfo do autor é sua capacidade de descrição das batalhas, tanto com e sem magia, pois são muito precisas e boas de se acompanhar. Isso alia-se a sensação de grandeza dos acontecimentos que um bom épico precisa com cenas e falas de personagens mundanos, combinando numa ambientação convincente. A combinação desses elementos faz com que ao final da leitura tenhamos a sensação de ter viajado para Kérdar, um lugar com paisagem e pessoas próprias.

Encontre a versão digital e impressa da obra na loja Amazon (de graça para Kindle Unlimited) em: https://www.amazon.com.br/dp/B096WF7Z95/
Leia Mais ››

segunda-feira, 8 de novembro de 2021

Resumo #208 - Acid + Neon "1.0" (Estúdio Coverge)


"Acid + Neon" (1.0) é uma antologia do Estúdio Coverge que elabora trabalhos artísticos que unem literatura a outras artes, como gravuras e música. Ambientados neste mundo cyberpunk, também há uma sequência Acid + Neon 2.0 e um jogo de tabuleiro chamado Belona. No site da editora podemos ter acesso a vários livros de graça em formato PDF (que ficaram boas para ler no Kindle, fica a dica), além das playlists com músicas originais no Spotify. Até o jogo de tabuleiro é possível baixar os arquivos para imprimir, também de graça. Pretendo falar mais do jogo depois de ler o segundo volume deste mundo cyberpunk. Espero que até lá a pandemia já tenha acabado para poder testá-lo e contar para vocês.

Os contos eu classificaria de dois tipos. Os que se parecem ser do mesmo mundo, pois se complementam em meio aos clichês cyberpunks e outros que oscilam bastante, distanciando-se dos clichês a ponto não restarem nada do cyberpunk. Particularmente prefiro que o autor tente domar os clichês que escrever algo tão fora do subgênero, talvez isso seja por este ser o meu favorito.

A Bala (Jorge Martins) A antologia abre com um conto rápido e seco. Uma atiradora de elite prestes a fazer justiça com as próprias mãos em um senador conservador contra pessoas que utilizam próteses. O desenvolvimento já valia o conto, por ser bastante imersivo, e o autor ainda nos brindou com um boa virada no final.

Deixe Queimar (Löui Moon) O segundo conto também aborda o uso das próteses. A pegada mais intensa e seca aumenta e se alimenta bem do conto anterior. O final é forte e combina bem com o ritmo do universo cyberpunk.

Caçadora (Mura Martin) Aqui temos um conto que usa bem o cotidiano neste mundo, com um acontecimento que poderia rolar em uma conversa de bar. Um causo cyberpunk. Bem colocado no início da antologia.

Desconhectado (D.R.Laucsen) Caos e Tecno são dois amigos bem diferentes. Um age guiado pela emoção e está em um amor virtual por uma DED, enquanto o outro tenta alertá-lo para a possibilidade de ser um golpe. O final é bastante inusitado e bem construído, pois as pistas estavam ali o tempo todo. 

Futuro (Leandro Leal) Conto avança no futuro, ainda mais, para recontar a história de Camelot e do Rei Arthur com uma roupagem cyberpunk/pós-apocaliptico. A lenda de Arthur não é cyberpunk por mais implantes e enxertos que se coloquem na história, ainda mais quando os confrontos não mudam. O conto me removeu da atmosfera que os demais estavam me inserindo, até agora.

Memórias (Borisse de Almeida) Conto que pincela um momento dramático na vida de um inventor, que vê sua invenção ser usada para fins terríveis. Em um conto tão curto, conseguiu estabelecer, vários problemas da tecnologias e ainda conseguiu arrematar o conto com uma passagem dramática bem colocada.

Myriade (Mauro Bartolomeu) Não achei que um conto sobre a colonização na Lua conseguisse manter a ambientação cyberpunk. O conto conseguiu mostrar esse mundo e ao mesmo tempo trazer um momento importante para transformá-lo. Gostei muito!

Manifesto em Roxo Neon (Ana Nogueira) Conto mais reflexivo, serviu mais para trazer informações sobre o mundo do que um enredo em si. Gostei mais por já ser receptivo ao universo cyberpunk que pelo conto em si.

Fantasma de Neon (David Leite) Conto que parece fazer referência direta ao conto Myriade, mostrando o outro lado. Uma missão, encomendada para eliminar hackers selenitas. Ação empolgante.

Despertar para o Amanhecer (Ana Paula Camargo) Uma mulher acorda sem memórias até que encontra sua avó que lhe traz a verdade. Uma tecnologia que coloca o leitor para pensar. Combina muito com este mundo.

Opressão Final (In)Consciente (Raul Coutinho de Almeida) Plácido foi recrutado obrigatoriamente para uma invasão em uma empresa brasileira. Não há nenhuma opção boa para ele, então resta escolher a menos pior, como é comum em enredos cyberpunks. Conto tem uma linguagem leve e com uma ação satisfatória. Combinou bem com o mundo da maioria dos contos.

Assassinos Sonham com Assassinos? (Pedro Henrique Silva) Conto bastante inspirado no Total Recall mas desta vez acompanhamos um assassino que busca roubar uma tecnologia que renderia milhões aos seus contratantes. Conto tem um bom desenvolvimento mas um final confuso.

O Avatar Não-Binário do Deus Virtual (Lewd) Mia recebe um trabalho aparentemente simples que pagará o carro voador que tanto deseja, matar uma celebridade virtual que tem um caso com um executivo. O desenvolvimento e resolução foram simples e conseguem surpreender, saindo um pouco do enredo padrão do cyberpunk.

Audiência (C)Ativa (Luis Cristiano) Para quem não é niilista o bastante, parece um prólogo de algo maior ou podemos chamar de uma pincelada de uma vida. O conto narra um intelectual reunindo jovens com potencial de transgressão.

Os Olhos Dela (Letícia Cristiano) Uma típica aventura cyberpunk. Eu adoro, principalmente quando está ao lado de contos que fogem demais do cyberpunk, mas pode cansar se não saem da zona de conforto. 

Injeção Letal de Culpa (Brick Alves) Um interrogatório em uma delegacia envolve duas mulheres. Acompanhamos caminhos opostos em rumos opostos. A virada no enredo não surpreende mas é tão bem feita que me fez gostar do conto.

Ícaro no Futuro ou Guarda para Sempre os Conselhos de Teu Pai (Paula Dias) A referência a lenda de Ícaro para o mundo cyberpunk funcionou. O tema das próteses robóticas de baixa qualidade, que há em outros contos, ficou sensacional aqui.

2337 (João Marcelo Rocha) Acho que foge da temática cyberpunk. É um bom conto distopico, dependente demais de um final que não me agradou.

Transição Vinte e Seis (Henrique Fanini Leite) Acompanhamos uma espécie de agente auxiliado por uma IA chamada Sputnik, e a medida que exploramos esse mundo, ele vai ficando cada vez mais misterioso. Criativo no uso das fontes e consegue estabelecer bem o mistério.

Nivhiun (Renan Fontella) Acompanhamos um detetive que investiga grupos ativistas e vende informações sobre eles para seus inimigos, mas tanto ele quanto seus inimigos querem elevar a situação a um novo nível. Bom desenvolvimento e final.

Chuva Sintética (Vilén S.) Conto policial com todo aquele ar noir, investigativo sob luzes neon mas que ganha outro aspecto do meio para frente e traz um final em que a investigação já não importa mais. Muito bem articulada e executada a mudança na trama.

Nova (Victor Wolffenbüttel) O protagonista tenta entender o mundo ao seu redor, aparentemente um mundo pós-apocalíptico em que a energia elétrica está definhando. A descoberta desse mundo, a caminhada e as respostas são recompensadoras no final.
Leia Mais ››

segunda-feira, 1 de novembro de 2021

Resenha #207 - Realidades Adaptadas (Philip K. Dick)


"Realidades Adaptadas" é uma coletânea de contos de Philip K. Dick que reúne apenas contos que foram adaptados ao cinema. Apesar de o livro ser também uma bela lista de indicações de filmes, podemos ver um padrão na forma como as obras do autor são exploradas pelos roteiristas. O humor e a ironia de Dick são lixados em favor de um aspecto sério, como se todos os mundos do autor fossem distopias. Quem ler os contos, já conhecendo os filmes pode se surpreender com essas facetas e, quem sabe, procurar algum de seus romances.

Lembramos para você por atacado (We Can Remember It for You Wholesale): Conto que serviu de inspiração para o filme Vingador do Futuro, que começa apresentando Douglas Quail, um "assalariado de merda" que não tem o tamanho de Schwarzenegger mas deseja ir a Marte. Então, recorre a Rekordações para receber um implante de memória de como teria sido a viagem. Após complicações no procedimento a estória segue um rumo diferente do filme. O conto aborda o que restaria de nossa identidade se pudéssemos manipular as nossas lembranças e experiências de vida. Publicado também na coletânea Vingador do Futuro, coletânea Minority Report e coletânea Máquina Preservadora vol I, com o título Recordações Por Atacado.

Segunda Variedade (The second variery): Se passa em um mundo devastado pela guerra entre EUA e URSS. As tropas soviéticas, após tomarem os Estados Unidos, são praticamente dizimados por robôs chamados "garras", inicialmente controladas pelos estadunidenses. A estória começa quando um soldado russo vai até uma base americana entregar uma mensagem e Hendricks vai até a base russa investigar. As "garras" que parecem drones, logo, tomam formas mais avançadas, explorando e destruindo a humanidade nos soldados. Tudo isso narrado de forma crua, mostrando toda a miséria da guerra, sem nenhum traço de bom humor - como é comum em outros do autor. Também publicado na coletânea Minority Report.

Impostor (Impostor) é a primeira estória do autor sobre o tema "Eu sou humano?". Nela temos Spence Olham, que trabalha num Projeto (indeterminado, relacionado a corrida armamentista) e passa a ser perseguido pelo seu amigo policial que o acusa de ser um robô espião de uma raça alienígena que teria feito uma cópia perfeita da memória do verdadeiro Spence Olham. O que chama a atenção não é apenas a dúvida "sou humano ou não" mas a capacidade de transferir memórias para um robô e este adquirir todas as características. É o transhumanismo abordado décadas antes (1953) do movimento Cyberpunk (anos 1980)! Também publicado na coletânea Minority Report.

O relatório minoritário (Minority Report): Conta a estória de John Anderton comissário da polícia pré-crime, uma instituição policial que utiliza "precogs", mutantes capazes de prever o futuro. Tal qual o filme, os policiais prendem os assassinos antes de cometerem um crime e a trama começa quando o nome de Anderton é apontado como um assassino. A estória envolve a existência da própria polícia, contudo, o faz por caminhos diferentes do filme. O conto tem personagens menos "maquiados" que no filme. Anderton é gordo e careca (nada parecido com Tom Cruise, em 2002) e os precogs tem aspecto medonho. A crueza do conto está nos personagens e não na ambientação (enquanto o filme transferiu isso para a ambientação e contratou atores bonitos). É um ótimo conto. Também publicado na coletânea Minority Report.

O pagamento (Paycheck): Conta a história de Jennings que começa indo a empresa pela qual trabalhou por dois anos para receber o seu pagamento. Pelo contrato, Jennings teve a memória apagada para evitar espionagem industrial. Contudo ao receber os esperados 50mil créditos, recebe uma sacola com sete objetos sem valor e nenhum significado aparente. Desmemoriado e duro, Jennings descobre que nos dois anos que foram apagados de sua memória, uma ditadura foi implantada e o governo passa a persegui-lo por causa dos seus segredos. Agora Jennings tem apenas sete bugigangas para encontrar a verdade. O conto tem uma ação inteligente, eletrizante e, ao mesmo tempo, desenvolve um mistério que aumenta a cada vez que Jennings encontra uma utilidade para um daqueles objetos e apesar de querermos ir para o final o quanto antes para descobrir, o grande atrativo do conto é o desenvolvimento da trama.

O homem dourado (The Golden Man): Em uma sociedade onde mutantes são uma ameaça a humanidade, um investigador da ACD encontra um tipo de mutante que é capaz de prever o futuro, tornando impossível capturá-lo. Apesar de adorar o filme, em comparação com o conto, foi uma adaptação medíocre. Ainda que o poder do protagonista seja melhor explorado no filme, o conto traz uma reflexão sobre a dádiva que os poderes representam, não necessariamente são benéficas. A clarividência do protagonista acompanha um comportamento que o impede de ver o tempo como uma pessoa normal e o impede de estabelecer relações sociais. Seria bacana que o tema de superpoderes tivesse esse cuidado com as deficiências que os acompanham.

Equipe de ajuste (Ajustment Team): O humor e a ironia já são muito presentes nos contos do autor. Aqui ele é especialmente sagaz e cômico. Ed acorda para tomar seu café pela manhã e se vê envolvido no fracasso de uma missão de vital importância atribuída a um cachorro pelo Escriturário. Ed acaba passando por uma experiência que o fez enxergar uma distorção da realidade. A agência onde o Escriturario trabalha é obrigada a intervir, enquanto Ed tenta assimilar o choque pelo que viu.  

Leia Mais ››

segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Resenha #206 - Olhos de Centauro (Lady Sybylla)


"Olhos de Centauro" é um romance de Lady Sybylla, que escolhe um assunto espinhoso para transpor em uma space ópera: o terrorismo. A space ópera é geralmente o subgênero da FC onde as aventuras espaciais acontecem, inclusive é a forma que popularizou naves espaciais, pistolas de raio laser e raças alienígenas. Contudo, temos aqui uma abordagem mais humana realmente interessada em especular sobre como seria a colonização espacial sob os ditames atuais. A colonização de novas áreas, interesses comerciais e políticos colidindo diretamente com o bem comum.

O prólogo, mostra Indara, personagem do conto "Mais um dia glorioso em Tau Ceti" em uma missão para os terroristas e uma outra referência ao conto "Missão Infínity", evidenciando que fazem parte de um mesmo universo. O trecho com Indara já chega mostrando a autora a que veio.

Acompanhamos o tenente Markus Hogstad que é retirado de suas férias e promovido com uma missão no mínimo ousada: comandar uma ocupação militar na base de Toliman, em Alfa Centauro que passa por uma crise, sob acusação de apoio a terroristas de Próxima Centauro, que é independente. O maior perigo da missão é que a ocupação militar possa ser considerada uma afronta a Soberania Madjen, grupo terrorista que assumiu vários ataques grandiosos que já ceifaram milhões de vidas. Hogstad vai ter que lidar também com as pressões de seu próprio governo em uma delicada balança política que envolve os direitos de exploração de Alfa Centauro. Hogstad busca auxílio do seu estado-maior, convocado entre alguns colegas com que já havia servido. Contudo, nada o preparou para a teia de relações políticas em um caldeirão de tensão.

A escrita da autora mantém a sensação de que alguma coisa muito ruim vai acontecer a qualquer momento, afinal acompanhamos o general Hogstad que em poucas horas na base, antes que pudesse estabelecer defesas efetivas, tenha que lidar com uma enxurrada de contratempos logísticos e políticos. A trama tem um ápice empolgante e ousado, que revela grande parte da fina teia de acontecimentos que Hogstad sequer suspeitava. A sensação, ao fim da leitura, é de querer saber o que vai acontecer com o protagonista. Não acho que convêm contar o final, mas ainda que ele não surpreenda o leitor - como me surpreendeu - certamente vai deixar pensando sobre o pior do ser humano não importa o lado da agressão. Não sei se haveria uma sequência, mas as reflexões sobre o livro vão demorar a sair da cabeça.








Leia Mais ››

segunda-feira, 18 de outubro de 2021

Resenha #205 - O Último Desejo (Andrzej Sapkowski)


"O Último Desejo" é a primeira obra do universo de fantasia do polonês Andrezj Sapkowsky que já era muito conhecido regionalmente e depois da série de jogos The Witcher alcançou fama mundial. Para a grande maioria dos novos fãs os livros ainda são um mistério e esta é a melhor obra para começar a conhecer as aventuras do bruxo carrancudo e mulherengo, que tem uma série nova na Netflix, baseada inclusive nesta obra, principalmente.

Neste livro temos um apanhado de contos que mostram as primeiras aventuras de Geralt de Rívia, um bruxo. Neste mundo, um bruxo é um ser humano modificado magicamente para ganhar força e resistência sobrehumanas para servir numa ordem de guerreiros que dominam algumas artes mágicas para combater monstros. Os monstros e lendas desse mundo são baseados na cultura eslava e vamos reconhecer muitas das histórias clássicas dos contos de fada em versões mais aproximadas ao que se contava antes de serem adocicadas ao extremo na Disney. O mundo é sujo cheio de seres mágicos, magos, reinos sedentos de poder e trapaceiros de todo tipo.

Os contos são intercalados por Geralt buscando abrigo com uma sacerdotisa chamada Nenneke e as conversas com ela e outros personagens acabam introduzindo as aventuras dos contos, que podem ser lidas em separado mas tem um gosto todo especial em ser lidos juntos na sequência pois vemos o personagem ser construído depois de apresentado. É sabido que o livro é bastante introdutório em relação a toda a saga, que é composta quase toda de romances. Já fui fisgado e vou ter que ler todos os outros.  
Leia Mais ››

segunda-feira, 11 de outubro de 2021

Resenha #204 - Oceanïc (Waldson Souza)


"Oceanïc" é um romance de Ficção Científica de Waldson de Souza, lançado pela Dame Blanche em 2019. O livro é dividido em quatro partes, sendo as três primeiras, com um narrador diferente e a última repetindo um deles. A primeira parte segue Jonas um funcionário de um restaurante Fast Food, cansado da rotina, quando revê um antigo amor (Rafael) com o qual não terminou bem. O reencontro provoca uma torrente de emoções que acaba nublando a percepção de outras coisas estão acontecendo mas quando, junto com o Jonas, percebemos que já é tarde. As outras partes abordam novos personagens e não acho interessante revelar muito, para não entregar demais. Enquanto conhecemos os personagens sabemos que as cidades da Terra existem sobre enormes criaturas que vagam pela superfície que guardam um mistério que não encoraja ninguém a descer das criaturas. Oceanïc é uma das maiores dessas cidades, tomadas por megacorporações que fazem experiências com "voluntários", sabemos disso através de Tamires que trabalha na limpeza de uma instalação controlada pela maior das corporações de Oceanïc.

Waldson criou um mundo muito genial de tão curioso e interessante. Começamos com uma narrativa intimista que depois expande para um mundo bizarro e somados as histórias de outros personagens formam uma história maior. Somos brindados com analogias totalmente pertinentes com nossa realidade e ao mesmo tempo nos submergem tanto em personagens bem trabalhados quanto em um mundo rico e interessante. É muito agradável ver o relacionamento homossexual tratado com a naturalidade que é característica, bem como a história de uma mãe que tem que lutar contra o mundo para reconstruir sua vida. É uma das propostas da editora, abrir espaço para essas narrativas e aqui o objetivo foi alcançado com muita qualidade. O livro exige uma sequência, ainda que o fechamento seja satisfatório, deixa muitas perguntas no ar e espero uma sequência que explique os mistérios dessas cidades monstruosas.


Leia Mais ››

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

Resenha #203 - Aventura Atômica (Ernan Batencour)


"Aventura Atômica" é uma novela cyberpunk de Ernan Batencour (pseudônimo) que parece fazer uma sátira dos clichês cyberpunks. A história mostra John Karsten que é sequestrado por uma família de mafiosos para fazer um roubo na sede de uma equivalente da ONU, que apenas ele poderia executar. Ele conta com astúcia e uma amiga/ajudante de cabelo roxo e, no assalto, encontra uma criança com equipamentos eletrônicos misturados ao seu cérebro que é uma experiência secreta que causaria muitos estragos em mãos inescrupulosas. Praticamente a mesma história de Turner em Count Zero de William Gibson, mas numa versão aventuresca (quase satírica) como o próprio título sugere. A leitura é leve, despreocupada e vai agradar quem não quer nada profundo para ler. O final procura trazer algo diferente mas que acaba não condizendo com o tom quase escrachado que trata os clichês cyberpunks. Não tenho certeza se houve a intenção de sátira. Espero que sim pois seria a única justificativa para profusão de clichês e ainda assim isso também não tem nada de novo. Pessoalmente prefiro um cyberpunk que se leve a sério, ainda que não rejeitaria automaticamente uma sátira desde que buscasse subverter tirando um sarro dos clichês e não apenas reproduzindo-os.
 
Leia Mais ››

segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Resenha #202 - Suell: A Revolução Silenciosa (Rômulo Kiffer)


"Suell: A Revolução Silenciosa" é uma das últimas leituras da minha Corrida Kindle Unlimited do ano passado, onde li vários livros em ebooks em 30 dias. O livro é uma novela cyberpunk com uma história bastante aventuresca e inocente de um punhado de rapazes que de alguma forma se envolvem com Suell, a líder de uma facção que quer acabar com todas as facções da comunidade para findar as guerras de gangues. A forma como farão isso é a mais óbvia: hackear servidores de dados. São seis capítulos, e cada um segue um dos membros do grupo as vésperas da grande operação. A escrita é ágil e correta, sem brilho que funcionaria melhor numa HQ. As artes do livro são sensacionais, tanto a capa quanto as que ilustram a abertura dos capítulos e é definitivamente a melhor coisa do livro. É uma boa leitura de praia, mas para um cyberpunk eu sempre espero mais!
Leia Mais ››

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Resenha #201 - A Penúltima Verdade (Philip K. Dick)


"A Penúltima Verdade" é um romance de Philip K. Dick, um autor recorrente do blogue pelo simples fato de ser o meu favorito. Isso ocorre pelas suas histórias estarem envoltas de enredos interessantes, quebras de paradigmas da realidade e uma escrita aparentemente simples. 

A história começa em 2035, com Nicholas St. James, presidente do abrigo subterrâneo de Tom Mix, um dos muitos que protegem a população da Terra enquanto os Wes-Dem e os Pac-Peop travam uma guerra que já dura 13 anos com exércitos de robôs. São os únicos capazes de combater na superfície contaminada pelas bombas atômicas deflagradas no início do conflito. Os habitantes ficam sabendo das novidades do conflito através de Talbot Yancy, o líder supremo dos Wes-Dem que enfrentam as forças inimigas do Marechal Harenzany. As populações dos abrigos tem a missão de produzir robôs para que eles combatam na linha de frente. 

Você acreditou nessa história? Então, você foi enganado, assim como todos os habitantes dos abrigos de ambos os lados. Tudo não passa de uma farsa. A superfície radioativa? Está tomada por áreas verdes e restam poucas áreas contaminadas. A guerra? uma mentira contata para manter o povo nos abrigos. Os Robôs? são usados como serviçais de uma elite que divide lotes imensos de terra. Talbot Yancy? Sua aparições são resultado de um programa que insere discursos escritos por alguns profissionais dessa elite que estão a serviço de Brose e são chamados de Yancyman. E Nicholas St. James é incumbido da missão de subir a superfície e conseguir um pâncreas artificial para o único mecânico que consegue manter as cosas funcionando no abrigo Tom Mix. Acompanhamos também Joseph Adams, um dos escritores dos discursos de Yancy que após uma discussão com um jovem talento entre os Yancyman, David Lantano, acaba envolvendo-se em uma trama cheia de assassinatos e disputa pelo poder sobre a figura de Talbot Yancy. Adams segue numa busca pela verdade atrás da fábrica de mentiras.

A obra usa o medo da guerra atômica apenas como pano de fundo e ironicamente acabou ajudando o livro anão ficar tão datado, pois geralmente as tecnologias cotidianas nas obras de PKD são bastante ultrapassadas, mas ninguém pode ser culpado de não prever a tecnologia digital em 1964. Uma 3GM tem potencial para regredir qualquer avanço civilizatório, quando não sua aniquilação. A tecnologia de órgãos artificiais está perdida e monopolizada por Brose que apesar de ser tratado como um vilão não permite que traçamos uma linha entre bons e maus. PKD é muito competente em colocar todos os personagens nas áreas cinzentas e somado a boa trama faz um livro muito bom, apesar não temos o melhor do autor, pois aqui falta os momentos mais lisérgicos que caracterizam seus livros. Recomendo a leitura, mas não para que se tire uma base do que é a obra de PKD, mas para os colecionadores como eu é um prato cheio!
Leia Mais ››

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Resenha #200 - Fractais Tropicais (Nelson de Oliveira Org)


"Fractais Tropicais: O Melhor da Ficção Científica Brasileira" é uma antologia que já foi lançada como a mais importante da FCB. A obra tem dimensões ambiciosas, tanto pelo tamanho quando pela variedade de autores que percorrem todos os períodos (chamadas Ondas da FC). O que une os contos é a proposta de ser um apanhado histórico da Ficção Científica Brasileira, que é dividida em três ondas. A obra começa com um prefácio muito instrutivo e inspirado do organizador que ao mesmo tempo situa qualquer leitor pouco familiarizado com a FCB quanto traz reflexões interessantes para quem já percorre os caminhos da FC. O autor foi bastante perspicaz em inverter a ordem de leitura dos contos, colocando os autores atuais para serem lidos primeiro e os mais antigos depois. Vamos analisar conto a conto. Os testos sublinhados são comentários retirados de postagens de antologias já publicadas no blogue.

3ª Onda

Além do Invisível (Cristina Lasaitis) - É o primeiro conto do livro e o primeiro conto do seu sensacional "Fábulas do Tempo e da Eternidade" que já resenhamos aqui. "Além do Invisível" aborda um amor conectado a internet em realidade virtual. Marcos e Maya depois de um ano juntos em um amor intenso resolvem mostrar sua verdadeira identidade. A condução do conto é delicada, sem pressa e com um final muito bonito e melancólico. 

O Templo do Amor (Ana Cristina Rodrigues) - Conto retirado de Portal Neuromancer, narrado na primeira pessoa, por um assassino entre dois templos, o da Morte e o do Amor. Ele recebe um contrato para assassinar Ophra, a sacerdotisa do templo do amor, para que uma nova sacerdotisa assuma. Uma caçada cheia de ressentimento começa.

Cão Um está desaparecido (Lady Sybylla) - Conto segue Sashi, um soldado de Becha I que acorda após um bombardeiro e não consegue encontrar o Meca (Cão 1) que devia proteger. Ela percorre o campo de batalha onde cruza com os horrores e uma guerra futurista em ambos os lados e começa a questionar se está do lado certo da guerra.

Menina Bonita Bordada de Entropia (Cirilo S. Lemos) - Conto já resenhado aqui. É um conto de Cirilo S. Lemos que entraria facilmente na categoria Weird Fiction, "Ficção Esquizita" que busca o estranhamento estético. Na história, uma menina é encontrada em alto mar, ferida quando é salva por uma embarcação tripulada por demônios e um capitão robô, que impede que a menina seja servida de almoço pelos sonhos mas a menina frágil não é o que parece. A construção é muito eficiente em causar estranhamento e é muito rica em provocar imagens em nossa mente e vale muito a pena ser lida. 

Metanfetaendro (Alliah) - Conto tem o estilo experimental do new weird e segue uma artista cheia de dúvidas. Conto repleto de figuras de linguagem através de Geometria não-euclidiana. De fato um conto difícil de acompanhar, pois escolhe um caminho ousado. Difícil de entender mas me instigou o suficiente a buscar o livro (homônimo) para ler os demais contos.

Da Astúcia dos Amigos Improváveis (Santiago Santos) - Conto oriundo do blogue Flash Fictions, que traz uma história de guerra cheia de revelações. Os humanos vão a guerra contra os Drokkarianos com a ajuda de seres incorpóreos, chamados de celestiais que nos ajudam na guerra mas após o primeiro dia em campo de batalha com uma missão fracassada acabou levando o protagonista a caminhos que mudarão a forma de ver os lados da guerra.

O Apanhador do Tempo (Márcia Olivieri) - Conto começa com um tom de tribunal com um homem admitindo sua culpa. O desenvolvimento mostra que o destino do planeta está para mudar e tudo é sobre imortalidade.

Aníbal (Andréa del Fuego) - Aníbal mostra, em forma de lenda, um fim da raça humana como conhecemos, sobrevivendo dentro de outras formas de vida. O conto brinca mais com os termos da Ficção Científica que especula propriamente, porém é o suficiente para fornecer uma boa viagem a quem não se fixar tanto na validade dos termos. Particularmente, adorei a viagem!

A Última Árvore (Luiz Brás) - Tudo gira entorno da última árvore do planeta. A sua volta uma favela, cercada por uma redoma e partes de um robô cobiçadas pelo "dono" da favela em constante luta contra outras fações. Os temas da ecologia e um humor sutil, característico do autor, permeiam esse conto sensacional. Conto cheio de brasilidade sem tirar o olho de questões universais. Você pode ler o conto aqui.

Quinze Minutos (Ademir Assunção) - Unabomber está chegando. Sua chegada/invasão a Terra é narrada de forma urgente e enquanto o autor explora sobre o que se trata tudo isso. O último parágrafo é revelador mas não explica demais. A pressa impressa na forma de mensagens urgentes é alternada por uma poesia louca e embaralhada que entendemos no final.

Cibermetarrealidade (Tibor Moricz) - O mundo é de metal, cada ser com sua função. Tudo está em constante autoreparo mas para um engenheiro que ronda a cidade a autoconsciência é um risco de ser considerado, ele próprio, uma falha. O conto se equilibra bem entre uma metáfora e reflexões sobre consciência, num fluxo gostoso de ler e complexo ao mesmo tempo.

Los cibermonos de Lacombia (Ronaldo Bressane) - Conto é um relato em portunhol de um agente temporal em sua última missão na busca de um desertor que usa a tecnologia do futuro para fazer justiça com as próprias mãos. Dá-se entender que o português é uma língua morta e a ação se passa toda na Colômbia (ou Lacombia). A narrativa é carregada de humor, inclusive no seu desfecho. A obra faz parte da obra Mnemomáquina e o conto só fez meu interesse pelo livro aumentar.

2º Onda

O molusco e o transatlântico (Bráulio Tavares) - Um dos contos mais extensos da antologia e vale a pena. Acompanhamos um explorador espacial brasileiro em uma missão internacional pelo espaço em um estilo que lembra 2001, tanto pela forma de narrar quanto pela viagem profunda em um contato alienígena. Contudo, não se apegue nessa comparação. Bráulio vai por um caminho bastante instigante e parece que não vai levar a lugar nenhum até as últimas linhas, quando entrega um final de deixar pensando bastante.

Paradoxo de Narciso (Ivanir Calado) - Um cientista consegue regressar no tempo e encontra a si mesmo. A atração entre o eu experiente que tem sucesso no seu invento e o seu eu jovem que ainda estava lutando para conseguir desenvolver o invento que o levaria até o passado. Temos o paradoxo de narciso explicado na forma deste conto muito intrigante com um final muito irônico. Ironia que carrega o conto do início ao fim.

Visitante (Carlos Orsi) - Uma fada guerreira chega a uma terra estranha e é conduzida por ser (que narra a história) programado para recepcionar bem sua visitante mas os encantos da fada atrapalham sua programação. Parece maluco e de fato é, mas um mundo pós muitas coisas que é construído e ampliado a cada resposta que a visitante obtém. Conto deixa o leitor preso nesse mundo estranho e a condução é segura revelando cada camada aos poucos. 

Ostraniene (Lucio Manfredi) - Acompanhamos um agente em contato estreito com um chefe straiter da Ostraniene (chamado Zósima) uma organização oriunda da queda do bloco socialista que vivia em equilíbrio com a rival Malta mas quando Zósima deseja um chip com informações, a Ostraniene passa a realizar ataques pesados e cheios de alta tecnologia. O protagonista contudo parece ter a chave para derrotar Zósima. O conto prende pelo desenvolvimento que gera uma tensão bacana e soma bem com a estranheza de basicamente tudo. Tem referencias legais a Neuromancer, principalmente na metade final. 

Galimatar (Fábio Fernandes) - É certamente o trabalho mais otimista que já li do autor, que imaginou um mundo onde pudesse existir algo tão sensível e interessante como a linguagem Galimatar. O conto fala sobre uma Xamanesa que encontra um homem azul (pós-humano) em Adis Abeba, capital da agora EtiPópia. A história simples é envolta de uma construção de mundo em hábitos tão bem narrados que conseguem segurar o interesse do leitor até o fim.  

A máquina do saudosismo (Ataíde Tartari) - Acompanhamos um homem que devido a leucemia, decide congelar-se até um futuro onde pudesse ser curado. Quando o descongelamento dá certo, séculos depois, ele acaba sentindo muitas saudades do seu tempo a ponto de não conseguir socializar com as pessoas do seu novo presente. 

Estrela marinha no céu (Finisia Fideli) - Conto curtíssimo e sensível sobre tudo que poderia nos alcançar quando olhamos para o céu. Há um pano de fundo de história mas vale mais pelas reflexões.

As múltiplas existências de Áries (Finísia Fideli) - Este não é tão curto quando o anterior, mostra uma vida de um ser extraterreno que habita o corpo de um funcionário do Banco do Brasil. É um retrato rotineiro do ponto de vista de um ser extraordinário. As finas ironias, fazem desta uma leitura muito agradável. 

Coleira do amor (Gerson Lodi-Ribeiro) - Félix perdeu sua amada Theresa mas não consegue aceitar a perda pois tem um sistema inibidor instalado que o impede de parar de amá-la. O conto tem momentos finais muito tensos, que envolvem violência sexual. Apesar do exagero na descrição das cenas, consegue fazer uma boa discussão sobre o livre-arbítrio, em relação aos sentimentos, e o pós-humano.

A sereia do espaço (Jorge Luiz Calife) - Uma astronauta francesa é capturada por uma forma de vida misteriosa em Tritão, lua de Netuno. Depois acompanhamos Gustavo, namorado da francesa, que se promove o primeiro contato com essa nova forma de vida. Conto bastante instigante, mas com uma história bem simples, recheada de imagens bem construídas. Bom conto.

Tempestade Solar (Roberto de Sousa Causo) - Conto faz parte das aventuras de Shiroma, compiladas em Shiroma: Matadora Ciborgue, já resenhado no blogue. Neste conto Shiroma vai atrás de vingança contra seus tutores, Tera e Tiago. Foi um dos pontos altos do livro e, como conto isolado, é uma bela peça de ação. Gosto muito desta série. 

Acúmulo de Skinnot em Megamerc (Ivan Carlos Regina) - Conto que pinta com cores absurdas algo do cotidiano. O estilo do autor é bastante sarcástico e contundente, de uma forma que ao procurar o fantástico basta uma ida as compras para ver que tudo está ao nosso alcance.

Quando Murgau A.M.A. Murgau (Ivan Carlos Regina) - Nesta outra participação do autor, conhecemos os Murgau, uma raça alienígena com três gêneros em um conto que fala sobre o amor livre. Instigante e belo. 

O dia em que Vesúvia descobriu o amor (Octávio Aragão) - Vesúvia é a história de uma nação que poderia ser o Brasil. Além da referência ao vulcão que destruiu Pompéia, temos uma história de um colapso. É um conto bastante cheio de jogos de linguagem e referências. 

Caro senhor Armagedon (Fausto Fawcett) - Retirado do livro "Cartas do fim do mundo", o conto é uma carta ao Armagedon, pois este furou seu compromisso de terminar com o mundo, após tanto preparo por uma empresa contratada pelo sr. Armagedon. O tom de indignação dos empresários dá combustível para uma explicação de todos os preparativos, falando sobre nosso mundo. A linguagem é fluida e quase sem pausas. É a primeira leitura do autor, após Santa Clara Poltergeist. O estilo próprio, eloquente e inquieto está nesse conto também.

1º Onda

O Grande Mistério (André Carneiro) - Conto narra uma trama política em que o sexo é parte do jogo, e tudo é tratado com uma naturalidade diferente. Isso faz realmente sentirmos em um lugar distante no tempo e essa sensação é o maior atrativo do conto.

A Ficcionista (Dinah Silveira de Queiroz) - É uma narrativa metaficçional, em que o controle criativo de vários autores estão sob controle de uma invenção que aglutina as pautas das ficções. Um dos contos mais extensos da edição. Preciso reler para captar melhor as nuances e melhora minha impressão do conto.

Chamavam-me de Monstro (Fausto Cunha) - Conto é um relato de um habitante de Ghrh que está na Terra tentando se adaptar as proporções tempo, espaço e prioridades alimentares enquanto ocupa de corpos humanos até bancos de praça. O relato também conta das diferenças entre o seu planeta natal e contextualiza uma guerra que coloca o ser humanos como sequer dignos de nota. Lembra bastante a sensação que o Guia do Mochileiro das Galáxias busca passar sobre a humanidade mas de uma forma que me agradou muitíssimo mais - apenas relevem que não sou fã da saga de Douglas Adams.

O Elo Perdido (Jeronymo Monteiro) - Flávio e Berenice realizaram o sonho de ter um filho porém ele nasceu muito diferente. O doutor Bernstein não sabe se trata-se de uma mutação mas suspeita que seja tudo tenha relação com o elo perdido. O conto narra a vida de Carlos e a adaptação de seus pais a condição única do filho. 

Morte no Palco - (Rubens Teixeira Scavone) - Conto bastante introspectivo sobre um último suspiro no espaço. Acompanhamos as reflexões do protagonista sobre o universo e sobre momentos com sua família. Conto para se ler devagar, saboreando as frases e esquecer o enredo.

Neste vídeo, que saiu no Diário de Anarres, no YouTube, falo do livro de uma forma geral




Leia Mais ››