segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Resenha #324 Primeiras Estórias (João Guimarães Rosa)

Primeiras Estórias de João Guimarães Rosa é uma coleção de contos do autor clássico. Como é uma obra de um autor clássico. Os resumos de cada história analisados em toda sua simbologia e relevância  podem ser encontrados em resumos escolares na internet. Este blogue não se pretende a ajudar estudantes de literatura a fazer trabalhos, apenas relatar breves impressões dos livros que li. A obra tem o seu conto mais reconhecido, A terceira margem do rio, definitivamente o mais intrigante e profundo do livro. Onde um menino passa a vida inteira tentando lidar com o pai que decidiu ficar parado em uma canoa no rio esperando que ele voltasse. A leitura mais óbvia é que se trata de um conto sobre o luto e confesso que me tocou profunda e pessoalmente.

Há outros contos muito gostosos de ler e outros nem tanto. Guimarães Rosa tem uma escrita bem peculiar, e difícil de se acostumar. Para mim ficou mais fácil imaginar que estava declamando a história (já que ler alto estava fora de cogitação para mim). Senti um ritmo de fala na forma de organizar os pensamentos, como se as coisas saíssem sem pensar em ordem mas obviamente o texto foi muito bem planejado pelo autor, que insere muitas sensações do jeito simples de falar do povo que vive em suas histórias. Há um artigo acadêmico em forma de introdução na obra que sinceramente pulei antes da metade de suas quarenta páginas. Confesso que ele poderia ter me ajudado a gostar mais do autor, mas não tenho mais a mesma paciência para textos técnicos como tinha há dez anos. Se caso este livro cair em suas mãos (como foi o meu caso) pode ler inteiro, mas se tiver dúvidas, comece por A terceira margem do rio e pare se não gostar deste. Depois dê outra chance quando adquirir mais experiência como leitor.

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segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

Resenha #323 Paraíso Líquido (Luiz Brás)

Paraíso Líquido de Luiz Bras é uma coleção de contos de 2010 onde já podemos ver as aventuras narrativas e que marcam sua ficção científica, antes de adicionar o humor que hoje é mais presente nos seus contos. O livro abre com Primeiro contato, uma história que embarca no universo infantil de uma aventura doce e sincera. Virando do avesso, Memórias é uma história que hoje chamaríamos de muito Black Mirror, mas antes de Black Mirror (2011) em que uma mulher duvida de tudo a sua volta, família, casa e relacionamentos. A tensão impera nos diálogos tensos e uma revelação estarrecedora. Nuvem de cães-cavalos parece acontecer no mesmo universo do conto anterior, com um encontro/duelo de um homem e uma jovem alucinação. Já Daimons é uma cruel brincadeira de entidades encarnadas em brinquedos com crianças inocentes, que poderia ser de um terror oitentista mas mais pesado.

Aço contra osso é um jogo de gato e rato virtual. Nostalgia começa como uma história de paranoia, bem philipkdickiana, onde não sabemos o que é real e não, para nos brindar com um final muito intrigante. Déja-vu é uma história de viagem no tempo que pode ser lida de trás para frente. Coisa que fiz assim que terminei o último conto e funciona muito bem. São Paulo, 31 de julho de 2013 é um conto epistolar com uma dose cavalar de sarcasmo, assim como Cruzada, que segue com o sarcasmo sobre a nossa pequenez frente a um grande mistério. Futuro presente é outra história de viagem no tempo, usando uma premissa antiga, um personagem congelado por muitos anos acordando num longínquo futuro, com o diferencial de que ela começa a história nos revelando que sabe quando vai morrer. Singularidade nua nos joga na space ópera com uma missão controlada por crianças trigêmeas criadas para habitarem em suas naves, para investigar um misterioso buraco negro. Protagonistas e figurantes conta a história de um acidente que atravessa a vida de várias pessoas que tiveram o azar de estar no lugar errado na hora errada, juntando um mosaico de pessoas e situações. Um quebra-cabeça cyberpunk. Por fim, Paraíso líquido é o maior conto e, por ter o nome do livro, o que mais me gerou expectativas, contudo, não consegui me conectar com a história e os personagens, que são elementos e emoções. 

Mesmo não curtindo o último conto, o livro é muito bom. Como é uma reunião de contos publicados em revistas e antologias, se apresentam em várias abordagens e tamanhos diferentes, mas dali podemos vislumbrar as experimentações, o trato na linguagem e um escritor que vai deixando o pessimismo de lado e começa a abraçar o humor, adicionando a brasilidade na sua ficção científica.

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terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

Resenha #322 Obra Completa (Murilo Rubião)

Obra Completa de Murilo Rubião, como o nome sugere, traz toda a obra do contista que se tornou um antecipador magnífico do que seria chamado de realismo mágico no Brasil. Para quem gosta do estilo de Frans Kafka, Gabriel Garcia Marques, Adolfo Bioy Casares e Júlio Cortázar, vai gostar muito destes contos. O que mais marca nas leituras é a capacidade do autor de jogar o leitor nas situações mais diversas e malucas. Efeito esse que aumenta quando você lê vários contos em sequência. Nem todas as situações são sobrenaturais, mas a estranheza que perpassa as situações independe do lado mágico, ainda que este é potencializado quando aparece. Um dos contos que me marcou foi o de um grupo de filhos adotivos, vindas de famílias famélicas, de um fazendeiro que abusava física e psicologicamente deles. Uma vez que o velho morreu, os irmãos se juntam em casais (sabem que não são irmão de sangue) e tentam se achar nesse mundo com a moral que aprenderam. Outro conto que gostei muito foi O Edifício antecede em muito o tema de A torre da Babilônia de Ted Chiang, mas com uma cara ironicamente mais moderna, ao acompanhar um engenheiro responsável por erguer uma torre de centenas de pisos, porém havia uma previsão de que haveria uma grande crise quando chegasse no andar de número oitocentos. Nem todos os contos são bons como estes mas todos são bem curtos e chegam (ou não) logo onde o autor pretende chegar. Infelizmente o autor não é tão conhecido, mas se você der uma chance com este livro não vai precisar de mais nenhum outro, mesmo querendo ler mais.

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segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

Resenha #321 Jogo da (im)paciência (Giselle Fiorini Bohn)

Jogo da Im(paciência) é um livro de microcontos escrito pela Giselle Fiorini Bohn, que se encaixa numa modalidade literária pouco explorada, que são os microcontos. Como o nome sugere, são contos muito menores que contos comuns, na qual o autor explora a técnica de contar uma história com poucas linhas. Giselle mostra o que aprendeu neste livro com um livro muito bem montado, dividido em quatro partes (uma para cada naipe do baralho) e cada parte contendo treze contos (um para cada carta do naipe) e, além disso, cada uma dessas partes faz uma abordagem diferente, sendo alguns mais ácidos, outros mais cômicos, outros mais românticos e outros trágicos.

Dentro dos vários estilos de microcontos, Giselle constrói histórias completas com enredos grandes para tão poucas palavras em cada história, mas sem perder uma das coisas mais bacanas do microconto que é a capacidade de deixar o leitor completando e complementando a história com a própria imaginação. O microconto torna-se assim, muito mais instigador que a fonte de toda a história contada. Como num bom livro de microcontos, cada conto tem uma página (e não mais que isso) para chamar de sua e Giselle explora enredos emocionantes, no sentido amplo e variado da palavra, numa coleção que é tanto uma excelente forma de apresentar o microconto quanto para leitores experientes.

Para conhecer mais sobre a arte do microconto, recomendo o podcast do portal Lume onde Giselle foi entrevistada junto com Fernanda C. Barbetta e com este que vos bloga!

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