Mostrando postagens com marcador Luiz Bras. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Luiz Bras. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Resenha #363 Voltas ao redor do sol 2024 (Rubens Ângelo org.)

 


"Voltas ao redor do Sol - 2024" é a segunda antologia organizada por Rubens Ângelo para o Clube de Leitores de Ficção Científica, sendo a anterior "Voltas ao redor do Sol", que por sua vez é uma homenagem a "10 voltas ao redor do Sol" que foi a primeira antologia organizada pelo CLFC, para comemorar os 10 anos da entidade. Felizmente Rubens não esperou chegar aos 40 anos para colocar em prática a retomada do projeto de lançar antologias para comemorar e agitar as coisas no CLFC.  Esta edição de 2024, comemora os 38 anos da entidade mais tradicional da nossa amada Ficção Científica e tive a satisfação de participar com um conto, que é uma história alternativa da Guerra dos Farrapos, mas antes disso pretendo falar um pouco sobre cada conto em separado.

Eutanásia (David Machado) se passa em um julgamento num tribunal onde a figura do réu, vítima e defensor se confundem enquanto lida com ataques de um promotor impetuoso. O autor demonstrou habilidade ao ordenar as revelações enquanto entendemos o caso e nos brinda com um ótimo desfecho. Conto criativo, com um tropo clássico da ficção científica numa roupagem "tribunal".

Neutrino (Ricardo Labuto Gondim) fez algo muito difícil: me agradar com histórias de viagem no tempo. Conta sobre um homônimo que entra em parafuso ao descobrir homônimos atuando na história da música clássica ao longo do tempo. O final é uma sacada genial.

O Aparelho (Walter Cardoso) em pouco espaço traçou um quadro poderoso de uma sociedade em colapso. Acompanhamos, um sujeito que se apresenta pela sua tipagem, é um gama, que nota sua rotina desmontar-se em sua frente mas buscando auxílio no Aparelho, que promete fornecer todas as respostas, tornando nosso protagonista incapaz de ver o mundo ruir ao seu redor. O conto termina abruptamente, como uma última pincelada neste quadro de horror na vida do sujeito.   

Placebo Quântico (Ludmila Hashimoto) conto que começa como um casal de namorados em um impasse sobre o destino de um animal de estimação, que ganha ares de loucura que escalonam em níveis cada vez mais lisérgicos. Gosto da coisa philipkdickiana que joga explicações científicas que explicam um fenômeno mas deixam os personagens cada vez mais longe de compreender o que acontece, exceto Baleia. Essa parece que entendeu tudo. Achei sensacional a tensão crescente nos diálogos. Alias o humor tragicômico é um tempero da autora que deixa o conto melhor do que parece. 

Tenório perde Sua Alma (Davenir Viganon) foi minha participação nesta antologia. O título faz uma referência ao clássico de Tabajara Ruas Neto perde sua alma, onde o general se fere na Guerra do Paraguai e relembra seu tempo de farrapo, assombrado pelos seus soldados subordinados Caldeira e Milonga. Minha história também é de arrependimento, onde temos Tenório, um Lanceiro Negro que conta em uma carta para seus filhos o motivo de tê-los abandonado. É uma história alternativa do Massacre de Porongos, onde os massacrados não foram os Lanceiros Negros. O conto é parte de um projeto maior, que também engloba outros contos.

Pupilas Douradas (Luíz Bras) é um conto que já havia lido em seu Symetrias Dyssonantes, onde comentei que "é um diálogo/entrevista com o desenvolvedor de um app que coloca uma IA para nos simular e poupar-nos de certas interações sociais que tanto evitamos. Como é de se esperar nem tudo vai como programado, até porque o programa passa a se controlar. É a primeira dose de ironia dessa vida conectada."

Últimas Travessias (José S. Fernandes) conto com uma histórias simples de conflitos de geração agravados pela tecnologia. No caso, temos o jovem Irtio que vive em Lunacar, um planeta que a humanidade colonizou, que deseja conhecer a Terra e outros planetas, mas seu pai se mantem ferrenhamente contra. Temos um conto dramático narrado com muita sensibilidade.

Boneca Denden, feliz quem a tem (Tibor Moricz) publicado anteriormente na sua coletânea Filamentos iridescentes, temos um conto característico do estilo do Tibor. Pós-apocalíptico, provocativo em relação a religião e sem freio quando choca o leitor. Gosto muito do estilo que tem muita força no seu livro Fome (resenhado no blogue) e aqui, esses temas são tratados com mais melancolia pela personagem principal ser uma boneca que vive com vários outros brinquedos tecnológicos, abandonados após uma provável extinção da humanidade. Esses brinquedos passam por um ritual que promete levá-los a uma terra prometida onde poderiam ser de carne e osso. O desenvolvimento do conto é de uma tensão crescente e o desfecho sensacional.

Eu sou eu (Juliana Vicente) conto curto, que conta a evolução de uma entidade narrada pela perspectiva dela, e a graça é tentar identificá-la enquanto mergulhamos no seu modo de ver o mundo. Lindo conto.

Sonhos, Discursos & Cronotransições (Gerson Lodi-Ribeiro) conto cheio de metalinguagem sobre um autor que tem sua mente levada para o futuro, enquanto recebe o Premio Argos de 2027, e é incumbido de uma missão para salvar a humanidade. O conto busca o caminho mais fofo, ao invés de uma ação sisuda e acredito que a escolha foi bem acertada. Conto leve e gostoso de ler, como um filme da Sessão da Tarde, no bom sentido.

C'mon Teletubby, teleport us to Mars! (Gabriel Carneiro) com uma escrita muito fluida, mesmo com parágrafos enormes, o autor consegue contar uma história engraçada de uma moça que só queria viajar o mundo sem gastar um rim e resolve construir uma máquina de teleporte. Brincando com os tropos da ficção científica e não contra eles, o autor trouxe uma peça de humor que refresca a nossa ficção científica.

A morte de César (João Ventura) em pouquíssimas palavras o autor contou uma história engraçada e com uma discussão historiográfica bem válida.

O Nevoeiro (Ursulla Mackenzie) Adoro histórias epistolares, ou seja, que são compostas de uma carta ou narrativa escrita de um personagem. No caso, um navio que cruzou por águas proibidas

Os dois livros (Marcelo Bighetti) conto divertido que brinca com as teorias da conspiração envolvendo grandes inventores do século passado, Alberto Santos Dumont e Nikola Tesla, que alegam que foram mortos por causa das consequências de duas invenções. Como aventura o conto desempenha seu papel em divertir.

Mycelisis (G. G. Diniz) conto curto mas que consegue elevar a tensão enquanto descobrimos o que está acontecendo. Difícil falar mais sem, talvez, estragar a experiência.

p.s. deixei a resenha de número 365 justamente para um livro que se chama Voltas ao redor do sol. :D
Leia Mais ››

segunda-feira, 29 de julho de 2024

Resenha #346 Mundo-Vertigem (Org. Luiz Bras)


Mundo-Vertigem é uma antologia do gênero Fantasia que busca explora-lo com uma abordagem que foge completamente a fantasia tradicional, com abordagens que vão do mais lisérgico até aquelas que há uma minima alteração da realidade, sempre buscando uma prosa mais refinada. A proposta do organizador é mostrar novas possibilidades para quem lê/escreve literatura de gênero, mas também mostrar a amplitude narrativa do fantástico aos que lê/escrevem no realismo.

São mais de 30 contos, a maioria bastante curtos. Não vou comentá-los um a um, mas destaco a composição de excelentes autores, como Bráulio Tavares, Fábio Fernandes, Ivan Carlos Regina, O próprio organizador, Santiago Santos, Romy Schinzare. Alguns contos eu já conhecia, como o Charlotte Sometimes do Fábio Fernandes, e o conto do Bráulio Tavares e do Ivan Carlos Regina. Gostei dos experimentos com fantasia urbana, mas nem tanto dos contos que pouco se adentram no fantástico, porque num cenário em que muitos tem vergonha de escrever fantasia, eu acabo ficando receoso com quem não adentra com vontade no fantástico mas não deixam de ser contribuições válidas de qualquer forma. Um livro muito bom para exploração, muito bem justificado em sua razão de ser nos textos de abertura e fechamento do livro. Algo que sempre procuro fazer nas antologias que organizo.


Leia Mais ››

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

Resenha #323 Paraíso Líquido (Luiz Brás)

Paraíso Líquido de Luiz Bras é uma coleção de contos de 2010 onde já podemos ver as aventuras narrativas e que marcam sua ficção científica, antes de adicionar o humor que hoje é mais presente nos seus contos. O livro abre com Primeiro contato, uma história que embarca no universo infantil de uma aventura doce e sincera. Virando do avesso, Memórias é uma história que hoje chamaríamos de muito Black Mirror, mas antes de Black Mirror (2011) em que uma mulher duvida de tudo a sua volta, família, casa e relacionamentos. A tensão impera nos diálogos tensos e uma revelação estarrecedora. Nuvem de cães-cavalos parece acontecer no mesmo universo do conto anterior, com um encontro/duelo de um homem e uma jovem alucinação. Já Daimons é uma cruel brincadeira de entidades encarnadas em brinquedos com crianças inocentes, que poderia ser de um terror oitentista mas mais pesado.

Aço contra osso é um jogo de gato e rato virtual. Nostalgia começa como uma história de paranoia, bem philipkdickiana, onde não sabemos o que é real e não, para nos brindar com um final muito intrigante. Déja-vu é uma história de viagem no tempo que pode ser lida de trás para frente. Coisa que fiz assim que terminei o último conto e funciona muito bem. São Paulo, 31 de julho de 2013 é um conto epistolar com uma dose cavalar de sarcasmo, assim como Cruzada, que segue com o sarcasmo sobre a nossa pequenez frente a um grande mistério. Futuro presente é outra história de viagem no tempo, usando uma premissa antiga, um personagem congelado por muitos anos acordando num longínquo futuro, com o diferencial de que ela começa a história nos revelando que sabe quando vai morrer. Singularidade nua nos joga na space ópera com uma missão controlada por crianças trigêmeas criadas para habitarem em suas naves, para investigar um misterioso buraco negro. Protagonistas e figurantes conta a história de um acidente que atravessa a vida de várias pessoas que tiveram o azar de estar no lugar errado na hora errada, juntando um mosaico de pessoas e situações. Um quebra-cabeça cyberpunk. Por fim, Paraíso líquido é o maior conto e, por ter o nome do livro, o que mais me gerou expectativas, contudo, não consegui me conectar com a história e os personagens, que são elementos e emoções. 

Mesmo não curtindo o último conto, o livro é muito bom. Como é uma reunião de contos publicados em revistas e antologias, se apresentam em várias abordagens e tamanhos diferentes, mas dali podemos vislumbrar as experimentações, o trato na linguagem e um escritor que vai deixando o pessimismo de lado e começa a abraçar o humor, adicionando a brasilidade na sua ficção científica.

Leia Mais ››

segunda-feira, 14 de março de 2022

Resenha #226 - Vaporpunk: Novos documentos de uma pitoresca época steampunk (Org.Fábio Fernandes, Romeu Martins)


"Vaporpunk: Novos documentos de uma pitoresca época steampunk" ou apenas Vaporpunk 2, trouxe novos contos para expandir o conceito de Steampunk nos contos da primeira antologia. A primeira mudança é a maior quantidade de contos, e o menor número de páginas no total. A abordagem também é diferente, não seguindo apenas a História Alternativa, mas também abrindo o leque para a aventura e a fantasia, nem sempre em cenários brasileiros.

Fábio Fernandes, um dos organizadores da antologia, abre o livro com "Alferes de Ferro", uma história que reconta a vida de Joaquim José da Silva Xavier, que a história imortalizou como Tiradentes. Nesta nova versão o alferes inconfidente tem um destino mais heróico do que de mártir da independência em um mundo em que a porção nordeste do império foi tomada e consolidada pelos holandeses, além de não poupar nosso herói das contradições da luta pela liberdade com a manutenção da escravidão.

Dana Guedes nos trás um conto episódico em "V.E.R.N.E. e o Farol de Dover" onde um grupo de anarquistas e libertários luta pela liberdade da classe operária, sabotando diretamente as operações do governo para proteger os industriais. Naquela missão, em específico, o grupo pretende destruir o HMS Guardador que transportaria peças industriais e sua destruição atrasaria por meses a construção de um parque industrial novo. Os personagens Beatrice e Dmitri são os mais trabalhados, e os outros membros da equipe são caracterizados por peculiaridades estéticas e não sabemos se sobrevivem para serem aprofundados em episódios futuros. Aliás essa característica episódica dá um sabor folhetinesco ao conto e nos faz querer saber mais.

Romeu Martins "Tridente de Cristo" narra uma segunda história do investigador policial João Fumaça quando vai a festa de casamento do estadunidense Neil Gibson com a índia brasileira Maria Pinto, amigos da aventura anterior, porém Neil e João são rendidos por um agente estadunidense a serviço da coroa espanhola. Neste mundo o Império Brasileiro e a Coroa espanhola são equivalentes aos Estados Unidos e a Inglaterra no século XIX, como potências mais relevantes. Infelizmente o conto deixa a desejar pelo excesso de informação e contextualização, do que acontecimentos que levaram os personagens até aquela situação. Absolutamente tudo que sabemos do vilão sai de sua boca quando revela em longos parágrafos seus planos. Nem Tião Gavião, discursaria para Penélope Charmosa por tanto tempo.

Nikelen Witter "Uma missão para Miss Boite" acompanha Ana Joaquina que vem ao sul do Brasil, aparentemente em viagem a visita de um amigo, junto do marido Serafim. Porém o casal faz parte de uma Sociedade secreta em missão: resgatar/roubar um artefato que deve ser protegido a todo custo. Ana contrata Miss Boite, uma mercenária ousada que aceita a missão. O conto tem reviravoltas muito bem feitas e cenas de ação inspiradas. Meu conto favorito da edição!

Luiz Brás "Mecanismos Precários" coloca em choque uma série de dicotomias entre um casal enfurecidamente apaixonado, digladiando-se em mechas a vapor destruindo a cidade até que um personagem inusitado coloca tudo de ponta cabeça. Conto cheio de metalinguagem que foge do padrão de histórias Steampunks mas que tem muito valor como literatura.

Sid Castro "Notícias de Marte" cria seu Brasil steampunk em paralelo com o nosso Brasil. Acompanhamos o Visconde de Cerradinho Antônio Almeida, aviador do Império Brasileiro embarcado no navioaeródromo Amazonas, em uma missão misteriosa que se perde da esquadrilha e é derrubado por um navio republicano chamado Amazonas. Logo Antônio percebe que está em um universo paralelo, sob a desconfiança dos oficiais da Marinha de um Brasil republicano ás vésperas de um motim que seria conhecido como A Revolta da Chibata. O motim é a única chance de Antônio voltar a sua realidade e concluir sua missão. O conto conseguiu colocar em paralelo ambos os mundos sem deixar o conto confuso, conseguindo contar uma boa história, com ação e um gancho para o final sensacional.  

Romeu Martins "Modelo B" segundo conto do autor na edição onde retornamos com o detetive João Fumaça. O conto me agradou bem mais, que  "Tridente de Cristo", pois conseguiu valorizar a ação e os acontecimentos sem muita contextualização. Ambas as histórias são simples, mas o perigo e os vilões ficaram mais humanos e razoáveis. Diferente do conto anterior, aqui terminei a leitura querendo mais contos do João Fumaça. 

Jacques Barcia "O cerco de Dr. Vikare Blisset" acompanha através do relato de um detetive encarregado de prender o Dr. Vikare Blisset um célebre anarquista que usa suas tecnologias para quebrar patentes científicas e tecnológicas controladas pelo Estado. O conto funciona pelos relatos e por trechos de relatórios sobre as armas, tecnologias e associados do Dr. Vikare que nos imergem nesse mundo e trazem excelentes cenas de ação. Um conto que funciona como tal e ainda nos deixa com muita vontade de conhecer mais este mundo.

Cirilo S. Lemos "Meus pais, os pterodáctilos" é um steampunk com cara de New Weird que tras uma história doce sobre um menino que vive com pais em Varup, uma cidade povoada por pterodáctilos que falam e vivem em sociedade. O menino adotado não é bem visto pela sociedade mas os pais do menino fazem de tudo para que ele seja aceito. A construção de mundo é soberba e não perde em nada para mundos estranhos e exóticos de China Mieville. Excelente encerramento para a antologia!
Leia Mais ››

segunda-feira, 2 de agosto de 2021

Resenha #194 - Distrito Federal (Luiz Brás)


"Distrito Federal" é um autodenominada rapsódia de Luiz Brás que saiu pela editora Patuá em 2014. A rapsódia é narrada como épico em frases separadas. Acompanhamos um curupira, ou a sombra do que um dia foi um, que encarna em um ser humano, passando a trilhar um caminho de vingança contra os político e corruptos caçando e matando um de cada vez, não importa quantos sejam. Eles não podem escapar pois o curupira (que é também um ciborgue) os detecta através de um cheiro terrível que eles exalam e apenas o curupira sente. Ele vem de um cerrado praticamente eliminado pela destruição do meio ambiente como um espírito vingativo. É o cheiro que o incomoda e não qualquer senso ético que o guia. No seu caminho vamos cruzar com vários outros personagens e acontecimentos que vão deixar a história ainda mais carregada de simbologias que vão exigir mais atenção do leitor.

O primeiro é a própria voz narrativa que conversa com o curupira, colocando a narrativa em segunda pessoa, e este nos revela sua identidade apenas nos momentos finais do livro. Outro personagem é o Saci que tem a mesma sede de sangue mas não segue o padrão do curupira e cumpre um papel de oposição e complemento em vários sentidos. Também temos Moema que é uma obtusa (pessoa não-corrompida), que joga um MMORPG chamado Distrito Federal, ao qual ela envolve-se e acumula poder até que ela não é mais reconhecida pelos seus parentes e amigos. Uma menina-menino, que é salva por uma entidade esfera-cubo-pirâmide, que vemos na segunda parte. Outro destaque é a própria cidade que eleva-se a forma de criatura viva num dos momentos mais épicos do livro.

A linguagem é o ponto que tanto pode ser um atrativo ou pode ser um motivo para não ler a obra. A minha experiência com o discurso indireto livre (principalmente Saramago) não é muito boa, porém a forma épica, não apenas na história, mas na escrita dividida em frases de um ou dois períodos, acabou facilitando bastante a leitura para mim. Como pode se esperar de uma narrativa épica, temos construções líricas que nem sempre conseguiremos entender imediatamente, porém as coisas começam a ficar mais fáceis a partir do segundo terço do livro e a história passa a nos recompensar pelas esperas. Distrito Federal é um aviso, um grito selvagem em forma de linhas cantadas. A narrativa em estilo pós-moderno na FC é algo muito positivo porque a forma não costuma ser uma preocupação dos autores e leitores e já estava na hora de aparecer nas obras e Distrito Federal mostra que não precisamos esperar uma obra de fora para isso.

Esta resenha tem versão em vídeo no Diário de Anarres!



Leia Mais ››

segunda-feira, 26 de julho de 2021

Resenha #193 - Symetrias Dyssonantes (Luiz Brás)


Minha cópia de Symetrias Dyssonantes fez uma viagem longa até minha caixa de correio. Ficou um tempo inominável num vórtice espaço-temporal ou, explicando para leigos, houve um atraso na entrega. Symetrias Dyssonantes aparenta ser apenas um livro de contos curtos de Ficção Científica, escritos por Luiz Brás, alter-ego de Nelson de Oliveira, e os primeiros contos até passam essa impressão, porém logo a viagem ganha ares lisérgicos em que cada conto a seu modo aplica golpes contundentes nas normas ABNT, explorando a linguagem com rebeldia inspiradora. Contudo, não se trata de uma exploração inconsequënte, pois o domínio do idioma, como dito no texto de quarta capa de Ricardo Labuto Gondim, é seguro.

O primeiro conto, Pupilas douradas, é um diálogo/entrevista com o desenvolvedor de um app que coloca uma IA para nos simular e poupar-nos de certas interações sociais que tanto evitamos. Como é de se esperar nem tudo vai como programado, até porque o programa passa a se controlar. É a primeira dose de ironia dessa vida conectada, seguida de Buscador, que trata de uma funcionalidade premonitória de um navegador ou uma profecia autorrealizável e, também, de Inteligência que contrapõe as maravilhas da tecnologia com os terrores que fazemos a nós mesmos. Em Você sai dois milhões mais pobre da arena dos negócios, começamos as explorações pela metalinguagem com uma versão menos eficaz da casa inteligente do conto anterior.

Presentinhos, foge da linha da FC explorando um caso de amor juvenil sentido pelo olfato. Polaroide é permeado pelo tom de despedida potencialmente suicida. Suspeita é uma conversa de um rapaz sobre uma garota estranha e uma camisinha que viajou no tempo. Manifestação muda o rumo da obra, nos jogando a um jogo de linguagem que nos faz oscilar entre o desejo de liberdade e as contenções que a vida impõe.

Distrito federal, é certamente o conto que originou o livro homônimo lançado pela Ed. Patuá em 2014. O conto é uma catarse de violência de um espírito vingador guiado pelo fedor da corrupção. O conto abre, o que poderia ser considerado uma segunda parte do livro. Com cenários distopicos, abordando um Estado Único e questões de gênero. Sob a cúpula acompanha uma trupe rebelde trans lutando contra o Estado Único e em Hotel extraordinarium explora um hotel tecnológico e deixa liberar a raiva contida e resolver o mistério na última frase.

Symetrias Dyssonantes é liricamente bizarro. Prosa exposta como música, referências a Beatles e Mutantes num portunhol narrando uma batalha épica entre Mapynguari Yabba Dabba Doo e a nuvem-nada. Passa a sensação de que só funciona para ser declamado em voz alta. O conto abre caminho para as loucuras que veem mais adiante, como por exemplo, personagens autoconscientes. O leitor atento vai suspeitar que Luiz Brás tenha passado a autoria deste e do último conto a mesma que assinou a orelha do livro. Revolução do ziper narra em duas camadas como o Estado Único empreende seu plano de dominação até um FIM que é devidamente derrubado por uma revolução. A metalinguagem brilha com um final lindo, ao menos na ficção.

Devorada pelo domingo, acontece em uma biblioteca em que Manuela conhece Tainá, mas ao fazê-lo desobedece a única regra da Velha. Parece se passar no mesmo mundo de Polaroide pois também temos uma Tainá, além dos Eumesmo e Elepróprio. Figuras recorrentes na obra do autor, como no conto seguinte Curto circuito camicase onde uma guerra surreal e uma contagem regressiva trazem uma conexão com o conto anterior e vemos contos que exploram a linguagem e sensações que em enredos amarrados. Saltos altos é frenético como tentar ler centenas de mensagens em poucos minutos e tentar entender o que aconteceu e precisar ler novamente para entender os detalhes. 

Este lado para baixo?, Obituário e Fim do lockdown, pourra! são pequenos minicontos cheios de raiva sobe a violência e nosso novo/velho normal, que nos fazem acelerar até Kurupira Maquinaíma alienigenus é o conto mais próximo possível de jogar cripto palavras na revista coquetel. A língua e a literatura se dissolvem sem que o narrador nada possa fazer para evitar. Por fim, [Epylogo] La profana santidad (ou El triunfo del completo y verdadeiro valor de pi) é um acerto de contas entre autor e personagens, narrado naquele portunhol do conto cantado que dá título a obra. É muito divertido ver o seguinte mantra transcender as eras e qualquer tentativa de enquadramento:

Então, fulana, você acredita mesmo que esse é o futuro da ficção? Marionetes que enxergam os fios? Criaturas sem corpo num mundo-fantasma? Personagens autoconscientes nascendo, vivendo, amando, sofrendo e morrendo num emaranhado de textos?

Symetrias Dyssonantes é uma coleção de ideias malucas, metalinguagens, que se tornam prolíficas quando aliadas a FC. Os que fazem questão de leituras (en)quadradas vão odiar suas linhas distorcidas porém não podemos acusar o autor de não tentar chegar até eles. A loucura, na forma, na metalinguagem, na recorrência de personagens é apresentada de forma progressiva.

Leia Mais ››

segunda-feira, 12 de abril de 2021

Resenha #178 - Era de Aquária (Coletivo KriptoKaipora)


"Era de Aquária" é uma publicação do coletivo KriptoKaipora capitaneados por Nelson de Oliveira, e criaram esta verdadeira obra da coletividade. O livro é uma coleção de contos com a ambientação em comum num futuro distopico, entre os anos 2050-60, onde a água ocupou quase todas as faixas de terra na superfície. Os acontecimentos do livro se passam no que restou de São Paulo, agora, Nova Piratininga. 

Os contos podem ser lidos separadamente mas juntos ganham força pois formam um mosaico rico e bem explorado como ficção científica, uma vez que esse mundo urbano submergido vai ganhando cores humanas a cada conto. Os contos conseguem se aprofundar nos personagens com muita agilidade, em comparação a outras coleções de Ficção Científica e ir direto ao que está acontecendo com cada um pois não precisam gastar linhas para se contextualizar a cada história.

O trabalho coletivo apresentado aqui lembra a série Wild Cards, guardadas as devidas proporções. Como em toda antologia, alguns contos vão agradar mais que outros mas mesmo os que não me chamaram tanto a atenção não destoam ou atrapalham a construção de mundo o que é o diferencial do livro, pois coletâneas de vários autores é difícil controlar e estreitar a discrepância entre os melhores e os piores, mantendo a qualidade. Era de Aquária consegue esse equilíbrio, pela proposta, pelo respeito ao tema e por ter sido uma leitura que me divertiu e agradou bastante. O destaque individual vão para "UIARA (Nathalie Lourenço), "Vias de fato, linha reta, caminhar" (Ricardo Celestino) e Uma constelação de estrelas adormecidas (Luiz Brás) muito devido a habilidade na escrita que conseguiu imprimir a brasilidade nas linhas desta Ficção Científica brasileira que está cada vez mais brasileira.
Leia Mais ››

segunda-feira, 1 de março de 2021

Resenha #172 - Salvem as Crianças (Luiz Brás)


"Salvem as Crianças" é um conto de Luiz Brás disponível na Amazon no formato e-book. O conto é uma distopia que parte da premissa de uma Ditadura de extrema-direita através de uma Universidade governada por um Reitor Ditador. O conto tem o mesmo ritmo narrativo de Anacrônicos: ágil, eletrizante, seguindo algumas linhas que se convergem e interagem até a conclusão e sem gastar uma palavra fora do que interessa. Essa última, uma característica na qual costuma-se definir um conto como tal. O tom irônico da construção do mundo é afiado com o atual contexto político e mostra como o autor foi sagaz em escrevê-lo em 2017. O momento ideal para ler esse conto é o quanto antes.
Leia Mais ››

segunda-feira, 11 de maio de 2020

Resenha #131 - Realidades Voláteis & Vertigens Radicais (org. Luiz Bras)

"Realidades Voláteis & Vertigens Radicais" é uma coletânea de contos de Ficção Científica brasileiros organizado pelo superativo Luiz Bras, pseudônimo de Nelson de Oliveira, que promove uma verdadeira reunião de novos talentos da Ficção Científica BR, onde temos muitos nomes para ficar de olho.

Os contos são separados em dois grupos que parecem dois livros distintos. A primeira parte, "Realidades Voláteis", são contos de Ficção Científica que fazem especulações usando muita ironia nos primeiros contos, que são bastante curtos, como em "Inteligência" (Laura Lin) e "Acordo" (Lígia Gomes), passando pelo escrachado "Relações Públicas" (Petrônio de Tílio Neto) e a alegoria política de "Zé e as formiguinhas ilustradas" (Ivan Carlos Regina) e vão elevando o tom de seriedade até o conto cheio de epístolas de um computador renegado em "Relato nº11" (André Argolo). Os contos são muito bem escritos e muitos deles bastante curtos (são 14 contos nas 100 primeiras páginas) e o que é muito bem vindo é o jeito brasileiro que corre solto nas páginas, não apenas nas localizações das histórias mas na fluidez no uso de situações e a  linguagem como usamos por aqui.


A segunda metade do livro, "Vertigens Radicais", se mostra totalmente disposto a  viajar a fundo no fantástico sem a preocupação da especulação. Contos que tendem mais ao  lisérgico e ao fantástico, sem abandonar completamente as especulações que caracterizam a ficção científica como em "Lourdes" (Lorena Ribeiro) e "Pílulas de Einstein" (Gisele Mirabai) onde o cérebro de Einstein viaja na mente dos cientistas. Em "O lixão trans-espacial (Tadeu Sarmento); "Novinha Suscetível" (Paulo Lai Werneck) e, principalmente em "O jardim das delícias não-terrenas" (Dindi Coelho), o sexo e a FC são abordados de forma descontraída, primeiro com a rotina dos habitantes de um lixão que recebe visitas de alienígenas, no segundo temos uma pincelada de um atendimento num bordel de ginoides sexuais e por fim o relacionamento de uma mulher com um ginoide que troca de forma ao gosto do cliente.

"Expire, inspire" (Belise Mofeoli) é uma pérola sobre a desigualdade que é a diferença entre a vida e a morte; e comprimidos não bastam. Temos o uso criativo dos computadores nos contos "Buscador" de Luiz Bras, organizador do livro, em que um homem pode buscar o futuro ou uma profecia autorrealizável?!; e "Invisible Tool" (Gláuber Soares) onde um programador não consegue mais sair do trabalho. Também temos duas viagens ao inconsciente, em "só restou eu" (Toni Moraes) e o conto do saudoso Maro Aqueiva, "Me and You" onde um piloto onírico está muito longe de estar no controle, sendo apenas um passageiro de uma mente criativa. e encerrando a segunda metade do volume, um conto com mais fôlego: "Quinas" (Tereza Yamashita), encerra o livro numa viagem maluca no tempo, transformações biológicas e uma fêmea traída.

O balanço final é de um livro muito divertido e gostoso de ler, e que mostra a Ficção Científica brasileira num momento muito prolífico, criativo e cheio de personalidade. Recomendo procurar essa obra e olhar com mais carinho para a ficção científica em terras tupiniquins.
Leia Mais ››

terça-feira, 18 de junho de 2019

Resenha #98 - Ás Moscas, armas! (Nelson de Oliveira)

Ás Moscas, armas! de Nelson de Oliveira (a.k.a. Luiz Brás), é uma coleção de contos muito sucintos, criativos e instigantes. São 25 contos em apenas 120 páginas. Na maioria ocupam apenas duas páginas. Sem medo de viajar pelos recantos da imaginação e da alma humana, o livro pede uma leitura saboreada e reflexiva. O estilo do autor é avesso a enrolação, preferindo a concisão e profundidade nos pensamentos e também pela criatividade nas histórias que podem te levar para qualquer lugar e essa é uma constante na obra e nas outras resenhadas no blog: Oneironautas do autor junto com Fábio Fernandes, Anacrônicos e Sabixões e Sabixinhos.

Vamos falar brevemente de cada conto, depois do conjunto. O livro abre com "A preponderância do pequeno" em que um frequentador da casa de campo do senhor Maxwell descreve seu dono refletindo sobre suas diferenças, os parênteses guardam a sinceridade. "Daltonismo" acompanha uma briga de casal embalada pela obra de Machado de Assis, sobre a não/traição de Capitu. Em "Ah!" Rubens passa mal e Ana Maria não sabe o que fazer. Depois o mundo vira luz. Todos viram luz. O conto nos faz imaginar eventos da escala pessoal até a global. Uma sensação que o autor passa em Anacrônicos. "Antes do Verão, depois da primavera" conta sobre o achado de Carlos e Joana: um baú de tesouros cheios de lembranças perdidas. Objetos simples mas que despertam memórias. O conto nos faz pensar sobre espaços entre as coisas e as coisas que se perdem lá.


"Amor", faz um retrato do lado dolorido do amor. Em "Baile de Máscaras", o alfaiate Zacarias Sepúlveda Bezerra é acusado de  um crime que não cometeu no dia de Natal e sua execução será transmitida pela TV. Conto usa os elementos do justiçamento e é um bom exemplo da literatura do autor na sua capacidade de instigar. "Entre paredes murmuramos sombras que nos assustam" é um pensamento corrido, escrito sem parágrafos, numa sentada só. Uma explosão de sentimentos. "Jaqueline in the box" nas primeiras linhas, Jaqueline foi apenas um bebê abandonado numa caixa de papelão, mas com com o passar do tempo ela se tornou uma caixa de papelão mais que qualquer outra coisa. O conto carrega numa linguagem infantil, de alguém que se esconde de sua dor já que não tem mais sua caixa para protege-la. "Lua, 1969" é um conto sobre duas entidades que conversam e se confrontam sobre a saúde de uma criança quando o pouso do homem a Lua era transmitido na televisão. É bastante enigmático, a ponto de eu ter entendido pouca coisa dele.

"Górgona" é dividido em duas partes, a primeira fala de uma profecia, usando de tom lírico e a segunda é um papo de bar com um escritor e tem um tom grotesco. É um conto de interpretação bem abstrata mas arrisco-me a entendê-lo como uma forma de mostrar os homens ameaçados pelo poder das mulheres que não veem da força. "Ninfas" pinta um quadro de caçada e fuga, sedução e armadilha. "Fora do quarto à noite", Edgar é um bombeiro idoso aposentado que imagina derreter tudo a sua volta. Conto de difícil interpretação, talvez seja sobre como ficar sozinhos e sentir-se repulsivo/destrutivo. "Inveja" brinca com os rótulos usando rótulos para nomear personagens invejosos. Usa a repetição de forma que fica divertido. "O Homem só" fala sobre Alberto um homem solitário, que não consegue transar com sua amante, pois tem mais prazer com suas fantasias do que na interação com outras pessoas. "Propósito" é uma página de elogio a Darth Vader mas desenha mais o admirador que o admirado. "Odor" descreve cientificamente a mais irracional das atrações. 

"O que eu faria se estivesse no meu lugar" é um conto circular que brinca com a alteridade de um rapaz que quer dar um presente para a namorada. "Quinze Minutos" pinta apenas com diálogos a correria diária, e com a repetição da rotina. É divertido e uma leitura ágil. Pequenas Reminiscências perdidas" conto curto gira entorno de Priscila e Rodolfo, num suspense que envolve até o fim. "Ruas" viagem onírica nas ruas de São Paulo, dominadas por diferentes animais domésticos e de rua. O narrador em primeira pessoa, não aprece ter uma raça definida. "Três tristes tias" cotidiano de três idosas cheias de manias, suas ações contrastando com as falas de um sobrinho que aparece apenas nelas enquanto as irritações das senhoras moldam a percepção de seu mundo. "Avenida Roshamon" temos um punhado de versões de um atropelamento. Fato distorcido e torcido muitas vezes, no boca a boca. "O que mais há a dizer?" faz pensar sobre quando as palavras são retidas e despejadas. "Um sujeito meio esquisito" um conto muito esquisito.

O livro é bastante aleatório nos assuntos, mas sempre girando entorno do insolito. Apesar das poucas palavras, é preciso ler e refletir antes de seguir o próximo conto. Não é uma leitura de praia, mas um mergulho profundo. Recomendado! 
Leia Mais ››

terça-feira, 2 de outubro de 2018

Resenha #75- Sabixões & Sabixinhos: Philosophus Brasilis (Sofia Soft, Teo Adorno)

Sabixões & Sabixinhos: Philosophus Brasilis é uma das obras mais recentes de Nelson de Oliveira, um dos autores mais prolíficos que tenho visto e acompanhado. Aqui ele assina com o pseudônimo de Sofia Soft e Teo Adorno. Nessa divertia coletânea de pensamentos que vieram para provocar e divertir. Os assuntos abordados são os mais variados, mas existe uma tendência a alfinetar o Brasil e o que é ser brasileiro. As passagens garantem reações que vão daquele sorriso no canto da boca, até paralisia temporária devido a reflexão digestiva do verso. O trabalho gráfico é uma atração à parte pois acompanha os toques ácidos e irônicos do texto. Leitura mais que recomendada!
Leia Mais ››

terça-feira, 31 de outubro de 2017

Resenha #67 - Anacrônicos (Luiz Bras)

Um livro é especial quando você o recebe de presente ou quando ecoam na sua mente após a leitura. "Anacrônicos" é especial para mim pelos dois motivos. A novela de Ficção Científica brasileira, foi lançada este ano de forma independente por Luiz Bras (pseudônimo de Nelson de Oliveira) que é encontrado nas redes pelo vulgo Paisagens Personas

Em primeiro lugar, Anacrônicos é extremamente bem escrito. Passa um desconforto pela forma narrativa que usa, como se você relembrasse momentos vividos contando em sua própria cabeça. Essa distorção na percepção do tempo acompanha os personagens, um grupo de jovens, que tentam lidar com a aparição de mortos-vivos (que não são zumbis) mas seres sintéticos "de um tipo de borracha industrial" extraídos das lembranças dos entes mais queridos que passam a ocupar os cômodos das casas e repetem ações das mais triviais diária e inexoravelmente. O foco é na dimensão íntima dos personagens, conseguindo abarcar o sentimento de caos no mundo todo. Tudo isso abarcando ironias, dores e desespero das pessoas que tentam levar suas vidas meio ao cotidiano e o caos que toma conta. A estória se passa num futuro próximo, quando todos nós estaremos um pouco mais velhos, se vivos. Temos uma aula de como situar uma estória no futuro sem forçar, sem infodump. Para uma sociedade que vive fugindo do seu passado, cansada de carregar o peso da própria bagagem, e o revive de forma cada vez mais ordinária, o livro é muito pertinente.

A forma do texto é curta e reflexiva, seria um erro chamar de prolixo pois ele tende a ser desconfortável (se você espera uma narrativa linear padrão). Vejo contundência e um potencial para quem puder refletir sobre si mesmo e o passado. Enfim, um livro curto que desafia qualquer busca pelo consumo rápido já é uma ironia em si. Pontos para o autor!

P.S.: O autor mantém um blog com resenhas de livros de ficção científica brasileira, que está se tornando um verdadeiro acervo de impressões do que é produzido no Brasil! Vale a leitura. https://ficcaocientificabrasileira.wordpress.com/
Leia Mais ››