quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Livros que mais gostei em 2016

Olá.
Não costumo postar muito em forma de conversa mas isso é algo que quero mudar para o ano que vem. Acho que fui muito frio nas minhas postagens desde o início do blogue. Pensando nisso acredito que estava tentando não impor minha opinião sobre os livros privilegiando a análise. Pretendo manter os textos curtos mas de alguma forma mais "simpáticos" no intuito de aumentar um pouquinho a aproximação com os visitantes do blogue pois o volume de comentários e da quantidade de visualizações, estão excelentes. Apesar do blogue ser despretensioso é voltado para um nicho e nichos são sempre exigentes. Desta forma, considerem-se abraçados. 

O motivo principal desta postagem é compartilhar uma lista com as leituras que mais gostei este ano e, ao contrário das resenhas, serei muito subjetivo. Foi muito difícil escolher e acho que se a lista fosse feita em outro dia teria um resultado diferente. 

Este ano fiz 45 resenhas, entre livros e contos, com os quais fiquei bem satisfeito em conseguir uma boa abrangência nas leituras variando bastante dentro da Ficção Científica. Quando sai da FC, para resenhar clássicos da literatura brasileira, foi por um bom motivo, impulsionado por uma das minhas obras preferidas esse ano. Também sai do escopo da ficção para buscar boas leituras de não-ficção mas que tivesse alguma relação com a Ficção Científica. Acho que fiz boas escolhas de leitura esse ano. Li clássicos e novidades, brasileiros e estrangeiros, livros de autoras e autores. Também compartilhei alguns contos próprios e pretendo melhorar como escritor. A lista não tem livros de não-ficção, não li tantos para valer uma lista.

Então, ai vai uma lista, em ordem aleatória dos 10 livros de ficção que mais gostei de ler em 2016. Seriam 5 e mesmo dobrando acabei deixando ótimos livros de fora. Cliquem no título do livro e você serão levados a respectiva resenha. Vamos a eles:
Um exercício de alteridade imersivo e profundo. Este livro foi como realizar uma viajem a um planeta desconhecido e, como toda boa viagem, nunca mais retornamos os mesmos. Já tinha lido, "Os despossuídos", outra viagem excepcional, e, por este ser o mais conhecido, me deixou com altas expectativas e foram totalmente atingidas. Um livro para levar onde for.
Última resenha deste ano. Tem clima e historias pesadas mas ao mesmo tempo cativantes. Ébrios apaixonados capazes de qualquer coisa, a decadência e miséria misturadas ao desejo e o amor. Amor romântico e amor tesão, sem distinção alguma. Baita livro!
Ficção Científica com Policial, que promove uma reflexão apurada e necessária do nosso cotidiano. Esse "estranhamento" da New Weird, deveria ser comum na Ficção Científica, nos fazer viajar para lugares estranhos e fazer pensar sobre a nossa vida normal. Esse livro me fez refletir muito e nunca mais consegui caminhar casual mente pelas ruas da minha (e de qualquer) cidade. Já estou, conhecendo outra cidade de Miveville, a Nova Crobuzon, em Estação Perdido.
Esta história alternativa imagina um rumo muito absurdo para o Brasil, onde a escravidão nunca acabou, mas pensemos uma segunda vez: Quem somos nós para chamar o Brasil imaginado pela autora de absurdo? Cheguei a criticar levemente o livro pela falta de interação entre personagens negros, mas isso faz mais sentido no Brasil de pesadelo da autora, sem heróis, sem final feliz, do que no nosso Brasil que de sonho não tem nada. [É fim de ano pessoal, fico pra baixo mesmo, mas continuem lendo que eu melhoro]
Após ler Farenheit 451, não devia me surpreender mais com a qualidade da escrita de Bradbury, mas em "Crônicas Marcianas", mais do que qualquer sensação de viajar pelo espaço, foi uma viagem na humanidade, afinal, não é quando somos estrangeiros que pensamos mais no local de onde viemos? Fico imaginando as pessoas que acham a Ficção Científica vazia de profundidade, lendo esse livro, e mordendo a língua.
Como pode um livro ser de leitura tão fluida e trazer tantas reflexões apuradas numa mesma pegada. Encontrei este livro num sebo e não pensei duas vezes. Li muito rápido e me vi obrigado a desacelerar para aproveitar melhor. Como disse na resenha, a FC foi montada em cada página, na minha frente. É como ver a linha de montagem desse nicho que tanto amamos. Fiquei empolgado novamente em saber que existem sequências, não-lançadas ainda, para o livro. Já estão automaticamente na minha lista de desejos. Já disse que gosto muito de romance epistolar? Vou acabar falando isso de novo aqui.
Já faz anos que queria ler este livro pelo plot maravilhoso. Restava ver como seria abordado. A ironia afiadíssima do PKD me deixou muito satisfeito. A New Weird, do China Mieville, deve ter bebido nesse estilo pela convivência relativamente normal entre raças tão diferentes. A loucura e a normalidade dos personagens me fizeram viajar longe.
Tomei conhecimento do autor por meio dos desafios literários do Entre Contos, dos quais participo. O livro me surpreendeu pois foi uma experiência muito melhor do que contos soltos do autor, que já são ótimos. A proposta de quebra da quarta parede me conquistou logo de cara. O livro é cheio de armadilhas nas quais cai com gosto. Terminei a leitura querendo ser que nem o Rubem quando crescer.
A Ficção Científica mais brasileira que tive a oportunidade de ler. Não pela putaria e palavrões que respingam na cara do leitor, (também isso, né?!) mas pela viagem cantada e crua desse cyberpunk brasileiro que, até onde sei, é o primeiro e até agora o melhor cyberpunk nacional que já li. Por isso, indiquei como primeiro na lista dos livros mais importantes da FC brasileira.
As características desse livro fecharam perfeitamente comigo. É um romance epistolar, uma baita estória, muito bem escrito e ambientando em Porto Alegre, cidade que amo odiar. Acima de tudo por salvar dos confins empoeirados dos sebos personagens e estórias da Literatura Brasileira, ignorados mal-tratados (para não dizer, mal lidos), pela grande maioria de leitores brasileiros. É aquele tipo de livro que já deveria existir a muito tempo. Quem ainda não notou, eu estou resenhando aqui os clássicos da literatura que foram reinventados neste livro. Já disse que é uma baita estória e muito bem escrito?

E você, caro leitor, já leu algum dessa lista?
Consegue listar os 10 que mais gostou, lidos em 2016?
ou acha isso tudo uma tremenda bobagem e eu deveria capinar uma roça?
Comentem!
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terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Resenha #57 - Noite na Taverna (Alvares de Azevedo)

Este é a segunda, de uma série de resenhas, que estou fazendo de obras clássicas da literatura brasileira que aparecem na série Brasiliana Steampunk, com o livro "Lição de anatomia do temível Dr. Louison" e alguns contos. A série coloca personagens da literatura brasileira em um mundo steampunk. De "Noite na Taverna", foi emprestado ao mundo criado por Enéias Tavares, Solfieri.

"Noite na Taverna" foi publicado postumamente em 1853, dois anos após a morte precoce de Alvares de Azevedo. São estórias cheias de tabus e violência ao mesmo tempo embaladas por amores fulminantes típicos do romantismo.

São cinco estórias contadas pelos homens que as viveram, mais um trecho de abertura e um de fechamento que a tornam uma única grande estória. Tudo passa em uma taverna escondida em um lugar indeterminado onde os personagens contam suas estórias. Após uma breve apresentação onde todos falam, Solfieri, Bertram, Gennaro, Claudius Hermann e Johannn, começam a contar histórias marcantes de suas vidas.  Vários tabus são quebrados ao longo do livro, como a necrofilia, antropofagia e incesto. Tudo regado a vinho e violência que os unem na taverna. Os nomes de diversos lugares do mundo e os locais onde narram suas histórias tornam a taverna não localizável, podendo ser qualquer lugar no mundo. 

O livro é de leitura bem curta. A edição que li, tem 96 páginas e tem uma linguagem carregada do rebuscamento do período. Como acontece com outros clássicos, já estão disponíveis em domínio público e são fáceis de encontrar em qualquer sebo com várias opções de edição. Isso favorece pois é possível encontrar um com letras maiores ou em melhor estado. 

Solfieri ganha o sobrenome de seu criador naquele mundo Steampunk. Um ocultista imortal que carrega as dores do tempo que vive a mais que os mortais, a dor dos românticos taberneiros da obra de onde saiu. Ainda que tenha participação tímida no primeiro livro da série, Solfieri aparece em mais dois contos onde é o protagonista. Espero lê-los para resenhar no blog.

O outro clássico resenhado no canal, nesta série, foi: O Alienista.

Baixe o livro, sem culpa, pois é de domínio público. 
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terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Resenha #56 - Vingador do Futuro (Philip K. Dick)

Vamos para outra coletânea de contos de Philip K. Dick, que a exemplo de "Minority Report" também foi lançada na carona de outra adaptação de um conto ao cinema. Desta vez é "Vingador do Futuro". Aqui foi lançada como uma coletânea avulsa de contos mas na verdade trata-se da "The Little Black Box - volume 5 of the collected stories of Philip K. Dick", ou seja, é o 5º volume de uma grande coleção lançado nos EUA. Vamos analisar os contos em separado:

Vingado do Futuro (ou Podemos recordar para você por um preço razoável - We Can Remember It for You Wholesale) É o conto que dá título a coletânea e a inicia. Serviu de inspiração para o filme Vingador do Futuro, que começa apresentando Douglas Quail, um "assalariado de merda" que não tem o tamanho de Schwarzenegger mas deseja ir a Marte. Então, recorre a Rekordações para receber um implante de memória de como teria sido a viagem. Após complicações no procedimento a estória segue um rumo diferente do filme. O conto aborda o que restaria de nossa identidade se pudéssemos manipular as nossas lembranças e experiências de vida.*

A mente alienígena (The alien mind) - Conto bastante curto. Bedford é um piloto espacial de uma nava comercial prestes a atracar no planeta Meknos III. O humor cruel toma conta da narrativa do meio para o fim. Muito bom!

Revanche (Return Match) Joseph Timbane, policial de Los Angeles apreende um fliperama em um cassino ilegal de alienígenas de Io. No laboratório, a máquina mostra um sistema que a impede de perder, nem que tenha de matar o jogar para isso. Philip K. Dick já havia abordado jogos como armas de guerra não-convencional em "Jogos de Guerra" (ver resenha de Minority Report

Não julgue pela capa (Not by its cover) Sr. Handy é um rabugento dono de uma gráfica de livros e fica intrigado com o mistério dos livros que parecem ter vida própria, manifestando-se alterando conscientemente os conteúdos originais dos livros impressos. Isso sempre ocorre quando estão envolvidos na pele de Wub, um animal de Marte. As modificações se dão sempre para defender a vida após a morte. Um significado mais profundo está no texto que veio da terra envolvido na pele de um animal marciano, nos mostrando como uma cultura não pode permanecer pura e nós estamos sempre envolvendo os textos em "peles de Wub" mudando seu significado ao longo do tempo e do espaço. 

A formiga elétrica (The Electric Ant) Gerson Poole, após um acidente, descobre que é uma formiga elétrica, nome pejorativo para androide, porém ele acreditava ser um humano genuíno. É interessante notar que é o caminho inverso do Homem bicentenário de Asimov, um robô consciente de sua condição que luta alçar a condição humana. Já Gerson Poole acreditava ser humano e tem de lidar com sua nova realidade não-humana. Nesse conto, Dick adiantou muitas coisas que seriam tema de "Androides sonham com ovelhas elétricas?". Limites da humanidade e da realidade.*

A pequena caixa preta (The little Black BoxO casal Joan Hiashi e Jay Meritan conhecem uma nova religião, o Mercecismo, que gira entorno da necessidade de empatia como principal valor. Os governos, tanto capitalistas como os comunistas começam a perseguir os adeptos e caçam seu profeta, Wilbur Mercer**. Neste conto temos a visão de religião do autor como um valor perigoso para o Estado. O aparelho que os merceritas usam para contactar seu profeta em rede é o objeto que dá nome ao conto. Este conto se conecta com um romance clássico do autor: "Androides sonham com ovelhas elétricas?". 

* = Estes contos já foram lidos, também, em outra coletânea (Minority Report) resenhada no blog. Então a analise é repetida.
** = Foi daqui que tive a ideia do nome do blog.
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terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Resenha #55 - Um passeio no jardim da vingança (Daniel Nonohay)

A obra de estreia do gaúcho Daniel Nonohay é um romance policial com elementos de ficção científica ciberpunk, ambientado numa Porto Alegre de meados de 2040. O livro foi bem divulgado na época do lançamento, porém passou longe do radar do fandom nacional de ficção científica. Contudo, ainda que seja essencialmente um romance policial com roupagem ciberpunk, quero destacar o valor da obra no campo da especulação futurista brasileira.

O protagonista, Ramiro Souza de Braga, é um advogado envelhecido tanto pelo tempo quanto pelas drogas e por uma vida basicamente sem propósito. Após um atentado à bomba, Ramiro passa a ser perseguido por uma rede de poder e influência envolvendo os próprios sócios de sua firma de advocacia. A busca por vingança é a única forma que Ramiro encontra para reconquistar o gosto pela vida.

Os outros personagens também se encaixam no tipo anti-herói, mais nos moldes da literatura policial do que nos moldes dos indivíduos excluídos do festim das grandes corporações futuristas. Ramiro é um dos cidadãos ricos, alguém enfastiado com o conforto, igual a qualquer magistrado acomodado na posição de autoridade dentro do poder judiciário. (Vale lembrar que Daniel Nonohay é juiz do trabalho em Porto Alegre.)

A ambientação dessa Porto Alegre do futuro é composta por uma atmosfera profundamente fendida, atualizando a clássica separação entre ricos e pobres. Nas páginas de Um passeio no jardim da vingança tudo é descrito de forma tênue e sutil; por exemplo, a disseminação das drogas sintéticas, os dois implantes cerebrais de Ramiro, as áreas muradas e seu aparato de vigilância que não são muito diferentes dos condomínios fechados de hoje. Os implantes cerebrais do protagonista, que potencializam sua memória e permitem acesso à internet, são mostrados de forma mais prática e sem o tratamento estético de um William Gibson, que o autor não chegou a ler. Essa sobriedade corriqueira do cotidiano no futuro acaba conferindo mais seriedade ao aspecto ciberpunk da obra. Ela é um diferencial muito relevante em comparação aos outros romances recentes desse subgênero publicados no Brasil, obras que ainda tentam emular a estética de Neuromancer. O resultado é que pendem mais para a sátira e menos para a especulação.

O trato sóbrio do elemento ciberpunk se dá pelo fato desse ser apenas um adereço em um romance policial, que tem suas próprias linhas para seguir, nesse caso, o mistério de um atentado que desemboca numa conspiração por mais poder. A obra consegue prender a atenção do leitor, com sua trama complexa, cheia de meandros jurídicos (sem se transformar em juridiquês). Esses momentos tomam conta da história no seu segundo ato, o que pode fazer o leitor esquecer que se trata também de uma FC, mas os elementos sci-fi continuam relevantes e fundamentais para as boas reviravoltas da trama.

Jogando com o presente, o passado e o futuro, Um passeio no jardim da vingança não é nada pretensioso em relação ao ciberpunk e talvez isso seja a melhor contribuição que a obra traz ao subgênero que mais concorreu para moldar nosso presente e nosso imaginário.
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terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Resenha #54 - A Metamorfose/O Veredicto (Franz Kafka)

Certa manhã, ao despertar de sonhos intranquilos, Gregor Samsa encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso”.

A primeira frase de "A Metamorfose" de Franz Kafka é uma das, se não a mais, geniais da literatura mundial. Em primeiro lugar, é um excelente sinopse jogando o leitor diretamente na trama e, segundo, adianta o estilo direto e seco do autor. Esta secura é uma das formas de mostrar seu amargor em meio a um turbilhão de sentimentos pessoais do autor que transbordam em toda sua obra.

A metamorfose não tem explicação. A desgraça cai sobre Gregor Samsa da noite para o dia mas a máquina não pode parar. Gregor continua tensionado a ir trabalhar, inclusive deseja voltar, mesmo odiando o emprego, enquanto isso todos continuam com suas preocupações. Gregor que antes sustentava a família, agora era literalmente um inválido, porém é indigno até de pena. Nesta forma, contudo, parece livre do emprego e das obrigações o oprimiam e seu aprisionamento no quarto se dá mais pelo sustento que não pode mais prover do que pela sua condição de inseto monstruoso. 

O que fica mais evidente em "A Metamorfose" é sua relação de respeito e ódio de Gregor com o pai. Essa situação é confidenciada, sem o manto da ficção, em "Carta ao pai". Entre essas duas obras, Kafka escreveu "O Veredicto" um conto escrito para sua noiva contando a estória de Bergeman um comerciante que troca cartas com um amigo na Rússia e, por mentir em suas correspondências sobre a sua situação, não sabe se o convida para seu casamento. O conto é um tanto confuso como estória e só faz sentido uma vez entendidos os dilemas de Kafka, que ainda não era tão habilidoso em cobrir seus sentimento, como viria a ser em "A Metamorfose". Ainda sim é um bom conto.

A edição lida para a resenha é a da L&PM pocket contem a novela "A Metamorfose" e o conto "O veredicto". Contém, também, textos analíticos no início e no fim do livro sobre a obra do autor e notas de rodapé que auxiliam leitores pouco iniciantes. Elas apontam as ironias e características literárias de Kafka por todo o texto. Apesar de forçar uma interpretação da obra considero como boas muletas para o leitor.
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