quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Resenha #44 - Piratas de Dados (Bruce Sterling)

Autores de Ficção Científica não tem a obrigação de prever o futuro pois, como diz Ursula Le Guin, a FC é uma forma de falar sobre o presente. Contudo, Sterling tenta imaginar como seria um mundo onde existe uma rede suportando um fluxo imenso de dados, ou seja, a internet. Encontramos um resultado desse esforço em "Piratas de dados" (Islands on the Net) lançado em 1988 e podemos dizer que algumas dessas tendências se confirmaram. Porém nada disso foi feito com adivinhações, mas com uma imaginação aliada a uma apurada leitura do seu presente de uma forma peculiar, assim como outros Cyberpunks.

Estória
Em 2033, acompanhamos Laura Webster, executiva da Rizome, uma multinacional em um mundo onde o tráfego de informação pela rede é a fonte de poder. Nesse mundo o Estado é uma instituição muito frágil e a política internacional se dá através dos chamados Paraísos Informáticos, controlados por bancos em pequenos países que piratearam acesso a tecnologia de informação, a empresas como a Rizome e grupos de mercenários, que usam Estados falidos da África como fachada. Chegando a estória, propriamente dita, Laura encabeça um plano da Rizome de conciliar (para domar) os paraísos informáticos, reunindo em uma chalé da empresa os representantes dos bancos de Cingapura, Granada e Luxemburgo. Porém um atentado com um misterioso drone vai deslanchar uma trama de espionagem e ação ao redor do mundo.

Uma grande ruptura
Assim como qualquer literatura, por mais que pretendam falar do futuro, acabam falando do presente. Contudo encontramos várias tendências na obra de Sterling que encontram similaridades com nosso mundo, e não é errôneo ver a obra do autor dessa forma pois ele continua, firme e forte, no esforço de captar as tendências para o futuro até hoje. Sendo assim, o grande acerto, foi pensar em um mundo pós-guerra fria. Em seu conto, "Vemos as coisas de modo diferente" ele já imaginava um mundo em que a União Soviética não existia mais, e em "Piratas de Dados", os personagens vivem num mundo sem o medo nuclear e a rivalidade da Guerra Fria. Algo que se tornaria realidade poucos anos depois do conto e do livro serem escritos com o fim da URSS no início dos anos 1990. O mundo estranho de Sterling, ainda tem drones, empresas incorporando características Estatais, Igrejas com valores completamente inversos e a mídia com tanto poder quando era possível imaginar nos anos 1980.
O que deixa a obra ingênua e datada frente a realidade, é justamente o papel do Estado frente a internet. Desde os atentados de 11/09 vimos o Estado agindo firmemente sobre a rede como podemos nos informar com o livro Cypherpunks (resenhado no blog.)

Espionagem e um resquícios do tempo
Tirando os aspectos políticos e tecnológicos além da obra, "Piratas de Dados", é uma espionagem cyberpunk, com uma boa dose de trama política em escala mundial. Tem, também, bastante aventura e ação. A trama é consistente bem costurada no intrincado mundo que o autor construiu. O livro não é curto, (360 páginas) demora um pouco a engrenar e estabelecer a missão de Laura pelo mundo, mas depois as coisas não param mais de acontecer. Agentes inescrupulosos, soldados e terroristas igualmente pouco confiáveis e toda a astúcia de uma sobrevivente. Como nem tudo são flores, a convicção de Laura é um pouco forçada, tornando-a inverosímel. O forte do livro é a construção de mundo (bastante globalizado) e enredo cheio de surpresas.
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quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Resenha #43 Conto, Não tenho boca e preciso gritar (Harlan Ellison)

[SEM SPOILERS]
"Não tenho boca e preciso gritar" é um dos melhores contos que misturam Terror e Ficção Científica. Foi escrito em 1967 por Harlan Ellison conhecido pelas antologias "Visões Perigosas" e "Novas Visões Perigosas".

A estória se passa num futuro onde uma Terceira Guerra Mundial foi travada com ajuda de computadores, que se rebelaram, tomando consciência ao modo de Descartes "Penso, logo existo", aniquilando a população mundial guardando apenas cinco seres humanos preservados para fins de tortura. AM, o computador consciente, modifica a realidade das vítimas e usa sua criatividade apenas para criar as piores torturas possíveis. Se o pessimismo em relação aos computadores já não era novidade na época do conto a intensidade desse retrato é intensa e criativa nas formas de tortura.

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terça-feira, 13 de setembro de 2016

Resenha #42 – Teoria do drone (Gregoire Chamayou)

[LIVRO DE NÃO-FICÇÃO]
A reflexão sobre os drones já foi uma quase exclusividade da Ficção Científica. Um exemplo, é a Máquina de Governar (livro de Philip K. Dick, de 1960 e já resenhado no blog) que mostra o mundo governado por um computador (de nome Vulcan) que usa "Hammers", que hoje chamaríamos de drones, que executam qualquer dissidente do governo. Contudo, o drone agora é uma realidade, desenhada com os traços da política de Estado e não apenas pelos escritores de FC.
Em “Teoria do drone", o filósofo francês Gregóire Chamayou, desenvolve uma análise consistente do drone como arma, partindo desde as contradições implícitas nas questões técnicas da arma até as concepções de Estado que se remodelam através dela, que desembocam no que ele chama de Estado-drone. O autor se posiciona criticamente em relação ao drone e, como o próprio diz na introdução, espera que os argumentos da obra sirvam para ajudar os opositores das políticas que privilegiam esta arma.

A desumanidade da arma “humanitária”: Chamayou tece suas ideias entorno do drone como uma arma desumana pois ela priva o adversário do combate ao não expor o operador ao perigo. Não se trata de uma chamada nostálgica aos antigos modos de fazer guerra mas de apontar as assimetrias que se acentuam fortemente no uso do drone armado e suas graves implicações na sociedade. 

A assimetria mais óbvia é a capacidade de combate, o drone torna impossível ao alvo revidar seu ataque, desaparece o combate tornando a guerra uma caça. Outra, que se esconde nos discursos, é a assimetria do valor da vida em ambos os lados da arma, que com sua política de “risco zero” de vidas do lado dos militares estadunidenses, aumenta drasticamente o número de vítimas civis onde o drone opera.

O autor usa os primeiros capítulos para traçar a origem das tecnologias que possibilitaram o drone e das políticas que as demandaram. Também é abordado o impacto no ethos militar, a mentalidade do guerreiro que orgulha-se de arriscar a sua vida, dado a ausência de combate no uso do drone. Nos últimos capítulos, a parte mais densa, Chamayou se vale da filosofia do direito em Kant, além de Hegel, Marx e Hobbes para refletir sobre a teoria de Estado influenciada pelo drone. Partindo da imagem do leviatã de Hobbes, Chamayou aponta o drone como uma forma de substituir o elemento humano da manutenção do Estado, o chamado Estado-drone.

Rebelião das máquinas e a falta de obediência
As estórias de FC costumam se pautar no antropocentrismo em relação as máquinas, como livro de Philip K. Dick que citei de exemplo ou no filme "Exterminador do Futuro 2", citado por Chamayou na obra. Geralmente as estórias que mostram robôs, drones, seres automatizados e as definem como armas que podem se rebelar contra a nossa vontade, ao contrário do que foram programadas, partindo daí o problema que as movimenta, tendo na solução o retorno da humanidade ao controle das máquinas. Chamayou contesta essa dicotomia: “Essa é uma formulação insuficiente do problema. O desafio real é o da autonomização material e política desse ‘bando de homens armados’ que é antes de tudo o aparelho de Estado.” ou seja, “Ao contrário do que sugerem os roteiros de ficção científica, o perigo não é que os robôs comecem a desobedecer; é justo o inverso: que nunca desobedeçam.”. É o total controle da máquina estatal é um perigo muito mais próximo.

Sobre a leitura da obra: “Teoria do drone” é uma leitura relativamente fácil e envolvente, devido a clareza com que o autor expõe o tema, com sentenças complementares explicativas. Temos um forte posicionamento contra as ideias dos defensores do drone. O livro muito recomendado tanto para quem quer entender as dinâmicas atuais da guerra quanto para quem procura refinar suas especulações em mundos ficcionais.

DOWNLOAD DO LIVRO FORMATO .PDF 

p.s. Em um trecho de "Piratas de Dados" (1988), de Bruce Sterling, um dos precursores do movimento cyberpunk, traz num diálogo, a dinâmica do uso de drones:

"- É como eles preferem trabalhar. Por controle remoto. Quando localizam os bandidos, atacam-nos com aviões-robô. Ficam perseguindo-os pelo deserto. Como hienas de aço matando ratos.
- Jesus!
- Eles são os especialistas, os técnicos. Aprenderam coisas no Líbano, Afeganistão e Namíbia. Como lutar contra terceiromundistas sem ser tocados por eles. Nem mesmo olham para eles, exceto pelos monitores dos computadores."
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quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Download Cyberpunk: Livros + Mangás

Vamos ao que interessa! Baixar uns livros e mangás cyberpunks. 
Só clicar no título (não na imagem).

MANGÁS
AKIRA                               GHOST IN THE SHELL
 

LIVROS

NEUROMANCER de William Gibson. Obra mais conhecida do cyberpunk e primeiro livro da trilogia do Sprawl. 

COUNT ZERO de William Gibson. Sequência de Neuromancer.

MONALISA OVERDRIVE de William Gibson. 
Terceiro livro da Trilogia do Sprawl.

IDORU de William Gibson. Estória se passa no japão onde se misturam máfia, otakus e um astro rock que namora uma IA.

PIRATAS DE DADOS de Bruce Sterling.

ANDROIDES SONHAM COM OVELHAS ELÉTRICAS? de Philip K. Dick. Livro que deu origem ao filme Blade Runner, que popularizou a estética cyberpunk no cinema.

UBIK de Philip K. Dick. O autor é considerado um antecipador do movimento literário cyberpunk.

SNOW CRASH de Neal Stephenson.


BRASYL de Ian McDonald. Livro tem um dos cenários, um Rio de Janeiro cyberpunk.

REALIDADES ADAPTADAS de Philip K. Dick: Livro de contos do autor que foram adaptados para o cinema.

MIRRORSHADES de Bruce Sterling (em espanhol). Uma das obras fundamentais para entender o cyberpunk, reunindo os escritores que deram início ao movimento literário. 

O CONTÍNUO DE GERNSBACK  de William Gibson. O primeiro trabalho profissional do autor como escritor.

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quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Resenha #41 Conto, O Contínuo de Gernsback (William Gibson)

[SEM SPOILERS]
O conto "O continuo de Gernsback" (The Gernsback Continuum) é o primeiro trabalho profissional de William Gibson.

A estória é de um fotografo contratado para fotografar prédios de arquitetura futurista dos anos 1930. Enquanto tirava as fotos acabou tendo uma visão desse mundo imaginado pela Ficção Científica dos anos 30 - dai a referência a Hugo Gernsback. Agora ele não sabe se foi uma visão de um mundo alternativo ou se está ficando louco.   

Neste conto, Gibson faz uma crítica contundente ao modo de fazer Ficção Científica da chamada "Era de ouro", em que o futuro limpo e perfeito imaginado por eles é retratado por Gibson como ingênuo e que já não servia mais para aquele momento. O conto é dos anos 1980 época de predomínio do subgênero Cyberpunk na FC.

Este conto é possível ser encontrado na coletânea "Reflexos do Futuro" (Mirrorshades) de Bruce Sterling, com tradução de Eduardo Saló que saiu pela coleção Argonauta. É um livro dificílimo de achar. Então aproveitem ao menos este conto.
Baixe o conto aqui no blog mesmo: DOWNLOAD - O CONTÍNUO DE GERNSBACK

Extra:Existe um filme de curta metragem chamado Tomorrow Calling, que é uma adaptação de The Gernsback Continuum
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