segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Resenha #256 Binti Trilogia Completa (Nnedi Okorafor)


"Binti" (2021) é uma trilogia de novelas de 2015, 2017 (Home) e 2018 (The Night Masquerade) que chega ao Brasil lançadas num único tomo. Felizmente a editora não tentou explorar a obra como uma trilogia comum, uma vez que a autora não pensou nas três novelas desta forma. Meu bolso agradece.

Uma vez que eu li as três novelas de uma vez só, é difícil separá-las e analisá-las em separado, principalmente a segunda e a terceira parte, que foram escritas após o sucesso da primeira. A primeira parte acompanha Binti, uma matemática brilhante pertencente ao povo Himba que foi aceita na UniOomza a universidade mais prestigiada da galáxia que fica a anos-luz da Terra. Seus problemas começam pelos Himba serem um povo tradicionalista e muito arraigado ao deserto, não permitindo que seus membros saiam da cidade de Osemba, que dirá do planeta. Binti, sentindo a necessidade de conhecer o mundo, sai mesmo sem autorização. No embarque já vemos que este mundo de Binti é fora dos padrões estadunidenses de ficção científica. A nave é um animal vivo que sobrevive no espaço, e comporta toda a estrutura para vida, chamado Terceiro Peixe. Binti faz vários amigos humanos durante a viagem e tudo parece um episódio de malhação até que uma chacina brutal feita por uma espécie de medusas guerreiras, deixando apenas Binti e o piloto da nave vivos. Binti consegue sobreviver apenas por causa de um objeto antigo, um edan, que repele as medusas e possibilita que ela consiga se comunicar com elas dando a chance de negociar pela própria vida.

Na segunda e terceira partes, tem um ritmo mais lento e não envolvem uma exploração espacial como eu esperava. Binti volta para casa após concluir o primeiro ano na UniOomza e se vê novamente em meio a guerra Khoush-medusa. Os Khoush são outro elemento importante no mundo de Binti, pois são o povo dominante na Terra. São brancos e negros vivendo sob um império que rejeita o tradicionalismo dos Himba e do Povo do Deserto, que por sua vez é considerado bárbaro tanto pelos Khoush quanto pelos Himba. Contudo, Binti, após ter parte do DNA das medusas fundido com o seu e se tornar elo entre esses povos, também descobre que tem sangue dos nômades do deserto. Alías, a transformação de Binti ao longo da história é constante. Não apenas física quanto de mentalidade. Uma metáfora para as transformações que os negros foram submetidos (muitas vezes contra a sua vontade) ao longo da história. A história revolve o passado de Binti para que ela solucione os problemas do presente da melhor forma que ela consegue. Essa passagem da adolescência para a fase adulta da vida, é um tema em comum de obras YA (Young Adult, Jovem Adulto) mas para um leitor mais velho como eu, que não se comove tanto por obras retratando um adolescente tenta encontrar um lugar no mundo, Binti não soa adolescente de 17 anos que é. Acredito que isso se dê pelas experiências de amadurecimento forçado que mulheres em geral tem principalmente em comparação aos homens, amplificadas pela situação da personagem.

O mundo de Binti é muito instigante pois a revelação de tecnologia escondida sob uma pretensa inferioridade dos Povos do Deserto foi explorada com riqueza. Alías riqueza define bem esse mundo cheio de formas convivendo, principalmente na UniOomza. Infelizmente não vemos mais desta universidade em Binti. Os coadjuvantes também contribuem como catalizadores das transformações da protagonista mas não tem seus próprios arcos tão bem desenvolvidos. Okwu, a medusa tem a estranheza e carisma que só uma criatura nada mamífera poderia ter. Dele e Mwinyi, representam seus povos, Himba e do Deserto. Dele tem um arco próprio mas aparece muito pouco enquanto Mwinyi aparece mais mas é apenas um guia. Mesmo não tendo um desenvolvimento próprio eles soam bastante reais e não desviam o foco que é em Binti. Acho uma característica perdoável em uma trilogia de novelas pois não há tanto espaço.

O salto geral é bastante positivo. A saga encerra-se bem sem necessidade de continuações, pois se para uma boa história o protagonista precisa encerrar de forma diferente de como começou, Binti faz seu dever de casa com louvor, pois o que mais acontece com ela são transformações.

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