sábado, 11 de junho de 2016

Resenha #27 - A mão esquerda da escuridão (Ursula K. Le Guin)

[SEM SPOILERS]
Esta é a obra mais conhecida de Ursula K. Le Guin. A mão esquerda da escuridão é um mergulho na humanidade, sem as metáforas usuais da ficção científica (robôs, androides) mas com a sexualidade, numa jornada através do gelado planeta Gethen e seus habitantes humanos hermafroditas. Esta obra é contada no mesmo universo ficcional de outros livros de Le Guin, chamadas de Ciclo Hainnish.* (mais detalhes lá no fim...)

Estória
Genly Ai é um enviado do Ekumen, uma liga dos mundos conhecidos, ao planeta Gethen. Também conhecido como Inverno, pelas temperaturas rondarem -30/-50ºC no inverno. O livro inicia quando já se passaram dois anos da sua missão: preparar os habitantes do planeta para ingressarem na liga espontaneamente. Contudo o choque de um terráqueo com uma cultura tão diferente, derivada de uma variedade humana que não possui distinção entre gêneros, vai atrapalhar seus objetivos. Seu contato mais próximo é com Estraven, primeiro-ministro da nação Kharide, de quem Genly não confia muito.

O que há neste livro
O livro se apresenta como um relato em primeira pessoa, alternando Genly, Estraven e alguns relatos curtos com tom antropológico, histórico ou mitológico sobre a vida no planeta. As descrições são bastante ricas: dos modos cotidianos ás divisões políticas, da mitologia ás paisagens geográficas. O leitor poderá se queixar de lentidão na narrativa (o que é bastante variável de leitor para leitor), mas nunca de não ter informações suficientes. Todas as evidências de um relato completo e genuíno. 
Le Guin diz no prefácio, que o trabalho do escritor é mentir e não prever o futuro, e ela mente compulsivamente bem. Tudo isso é conduzido com uma escrita muito habilidosa e muito acima da média entre os escritores de Ficção Científica. É quase possível sentir o frio de Gethen. 
Mapa de Gethen, retirado do site oficial da autora

Ousar imaginar um novo mundo
As especulações sobre a vida desses seres que carregam os dois gêneros são bem trabalhadas pela estranheza de Genly em sua relação com Estraven, que conduzem a um final bem construído. O objetivo é, assumidamente pela autora, pensar na nossa própria condição humana no presente. É uma Ficção Científica feminista por ousar vislumbrar uma sociedade sem uma relação de superioridade entre gêneros, afinal eles não existem em Gethen. Alias, é interessante ver os gentheninanos considerarem uma "perversão" ter um gênero definido todo o tempo, entre outras singularidades.

Considerações finais
É um livro que tem um potencial de marcar o leitor, ou seja, muda-lo de alguma forma após a leitura, não apenas por apresentar um novo mundo imaginado. O que Le Guin faz é mostrar um mundo possível e também como ele é através de metáforas brilhantes. Os personagens são bem construídos pelas relações que estabelecem entre si e o mundo. É um livro mais do que recomendável.

Livro lido para esta resenha: O livro foi formatado numa letra bastante confortável e tem um prefacio muito profícuo para entender um pouco do que a autora entende por literatura e ficção científica. O único aspecto negativo é a ausência de um mapa de Gethen, (a edição antiga de Os Despossuidos possuía um mapa) o que facilitaria muito nas partes em que a geografia do planeta é trabalhada com mais detalhamento.

Outras edições do livro:
 

Nota:
* Livros dos Ciclo Hainnish: Na ordem cronológica com a data da primeira edição.
Floresta é o Nome do Mundo (The Word for World Is Forest) – 1976;
Planeta do exílio -1966;
Cidade das ilusões – 1967;
A Mão Esquerda da Escuridão (The Left Hand of Darkness) – 1969;
The Telling – 2000; 

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