terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Resenha #114 - Pequenas Mortes Cotidianas (Paula Gianini)


"Pequenas Mortes Cotidianas" (2017) de Paula Gianini é um daqueles pequenos achados literários dos quais não podemos desperdiçar. Já tinha contato prévio com os contos da autora o que me deu segurança para começar a ler. Paula entrega um livro de contos bem curtos, sem perder a profundidade e com uma coerência de uma coleção de contos deviam sempre ter. 

O tema morte(vida) estão presentes em toda a obra. A morte aparece na forma de perdas e lutos, que invariavelmente nos modificam. A autora usa as mais variadas formas de nos trazer isso: Pontos de vista inusitados, como animais ou uma doente em coma, outras vezes momentos de desespero em linhas de pensamento fluídas, memórias em momentos limite.

Alguns contos já foram publicados na plataforma EntreContos e deixei os links nos títulos, enquanto comento os contos individualmente. Só lembrando que as versões linkadas, ainda não tinham sido revisadas para o livro. Demais contos da autora na plataforma estão aqui, para vocês apreciarem. Então vamos aos comentários individuais dos contos:

"Mariposa" conta as reflexões da breve vida uma idosa que desperta de um coma de muitos anos mas que não consegue se comunicar. Conto se destaca pela perspectiva da protagonista e o conceito do título bem atrelado ao conto. "Com a ponta dos dedos" narra as primeiras sensações de uma menina interagindo com o mundo. Outro conto que soube explorar bem o ponto de vista. 

"Dejavú" conta sobre uma mulher que repensa suas decisões da juventude quando encontra uma Kombi colorida numa autoestrada. "Passarinhos" é sobre Laura, uma menina com o dom de ressuscitar pequenos animais em uma pequena e cruel cidade distante de tudo. Gosto quando o conto abraça o fantástico de forma despretensiosa. "Quase" inverte o rumo introspectivo do livro, até então, e pinta um retrato bem humorado da baixa auto-estima de uma mulher que não percebeu o tempo passar. 

"Mar de vidro" conta sobre a rotina de uma menina bagunceira sob o ponto de vista de um peixinho de aquário. "Porco no rolete" passeia entre o trágico e o cômico nos traumas de uma vegetariana, agora viúva, que se vê obrigada a prestar pêsames em uma família que presenciou seu evento tragicômico com um porco no rolete. "Bob" conto narra sobre o abandono de um cachorro na visão do próprio. Vejo como a morte se encaixa aqui como a morte da empatia por quem dedicamos amor.

"O espeleólogo", usa o inusitado cenário do Camboja para contar sobre um menino que se espelha no seu avô, detalhando suas lembranças que moldam o seu caráter. "A lagartixa" conta sobre a relação de uma transsexual filha de um político e consigo mesma. "De saltos altos" é uma narrativa insólita de uma mulher que não se vê por completo e depende de outra figura para se completar. "(...)" conta das lembranças fragmentadas de uma mulher que observa o mar e encontra uma garrafa com uma mensagem. A forma narrativa do conto é sensível e brilhante. 

"Ossos Largos" narra uma trajetória de baixa auto-estima com um final tragicômico, que nos relembra que o caminho para melhorar não pode excluir a nós mesmos. "Casal Perfeito" mostra o desmoronamento da hipocrisia de um casamento falido no desespero do marido abandonado. É o único homem protagonista e foi moldado de maneira muito crível. "Inventário" conta sobre acumuladora de objetos que repassa sua vida ao vasculhar sua casa procurando uma caixa com maçanetas. O título condensa bem a ideia se reavaliar, e pensar no que não fez durante a vida.

É necessário advertir ao nosso leitor de Ficção Científica, que é uma obra fora do tema do tema do blogue, contudo o livro é uma boa forma de intercalar entre nossas leituras. Vale a pena não apenas pelo flerte com o fantástico, mas pela qualidade desses contos em tão poucas páginas. A recomendação aqui é colocar esse livro na sua lista entre a leitura daquela nova edição de Fundação e de Duna que vale a pena!

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