Resenha publicada originalmente no blog Entre Contos.
[SEM SPOILERS]
“Número Zero” foi a último romance de Umberto Eco, lançado em 2015. O autor que, entre outras coisas, foi um estudioso da mídia e fez nesta obra um panorama sarcástico do jornalismo atual. A estória começa jogando o leitor, logo de cara, na paranoia de Colona, um redator fracassado que consegue um emprego num jornal que está para ser lançado – que se chama Amanhã. Grande parte da estória se passa numa retrospectiva de Colona o seu tempo no jornal, onde entendemos o motivo seu tormento. Logo em seguida, quando Colona recebe a proposta de trabalho de seu chefe, Simei, descobrimos que o jornal é apenas uma arma de seu financiador misterioso para galgar poder na alta sociedade financeira italiana chantageando com notícias desfavoráveis a seus desafetos. O trabalho de Colona, Simei e dos outros seis colegas é criar o jornal, montando edições de exemplo para mostrar ao dono com seria a publicação quando lançada, essas edições são chamadas de número zero.
Mau jornalismo
O ambiente da redação é onde acontece uma verdadeira aula de mau jornalismo, o perfil extremamente antiético do jornal é delineado pelo chefe Simei com um humor ácido e desapaixonado. Enquanto os dias passam Colona envolve-se em longas conversas com seu colega Braggadocio onde ele o coloca a par de uma investigação sobre uma teoria de que Mussolini sobreviveu a 2ª Guerra Mundial. Estas partes foram as mais massantes da leitura, ainda que contenham uma crítica pertinente aos que alimentam esse tipo de teoria.
Itália: Terra da Pizza
O patrão ricaço e misterioso de Colona e o fato da estória se passar em 1992, são referências a operação “Mãos Limpas”, que desestabilizou o sistema político italiano naquela época e que veio a se reconfigurar quando Silvio Berlusconi, o empresário milionário (dono de jornais e do clube de futebol Milan) se tornou primeiro-ministro da Itália, cargo que ocupou pelas duas décadas seguintes. A partir dai fica mais evidente que a (falta de) ética do jornal é a forma que Umberto Eco usou para criticar a política italiana que nasceu dali, tão corrupta ou mais que a anterior, e a crise econômica que se acentuou de uns anos para cá no país. Enfim, como dissemos no Brasil: tudo acabou em pizza, mas Eco encontrou uma analogia mais interessante. O nome do jornal em que colona trabalha, nunca chega a ser lançado. É o amanhã que nunca vem.
Considerações finais
Por ser uma estória curta, (são duzentas páginas em fonte grande) não há muito espaço para o desenvolvimento do protagonista, contudo está longe de ser uma estória rasa, como já vi em algumas resenhas, pois o texto tem várias camadas que remetem a história italiana desde a segunda guerra até o período de Sílvio Berlusconi, que podem escapar ao leitor despreocupado brasileiro. Número Zero parece ser um livro simples mas esconde muito elementos não-ditos, assim como as notícias de um jornal.
Separei uns trechos interessantes, que se passam na redação do Amanhã.
— A questão é que os jornais não são feitos para divulgar, mas para encobrir as notícias.
— Não são as notícias que fazem o jornal, e sim o jornal que faz as notícias.
— Os jornais ensinam como se deve pensar…as pessoas não sabem no início que tendências têm, depois nós lhes dizemos e elas percebem que as tinham.
— Percebam que hoje, para contra-atacar uma acusação não é necessário provar o contrário, basta deslegitimar o acusador.
— Não é necessário inventar notícias, é só requentar.
Mau jornalismo
O ambiente da redação é onde acontece uma verdadeira aula de mau jornalismo, o perfil extremamente antiético do jornal é delineado pelo chefe Simei com um humor ácido e desapaixonado. Enquanto os dias passam Colona envolve-se em longas conversas com seu colega Braggadocio onde ele o coloca a par de uma investigação sobre uma teoria de que Mussolini sobreviveu a 2ª Guerra Mundial. Estas partes foram as mais massantes da leitura, ainda que contenham uma crítica pertinente aos que alimentam esse tipo de teoria.
Itália: Terra da Pizza
O patrão ricaço e misterioso de Colona e o fato da estória se passar em 1992, são referências a operação “Mãos Limpas”, que desestabilizou o sistema político italiano naquela época e que veio a se reconfigurar quando Silvio Berlusconi, o empresário milionário (dono de jornais e do clube de futebol Milan) se tornou primeiro-ministro da Itália, cargo que ocupou pelas duas décadas seguintes. A partir dai fica mais evidente que a (falta de) ética do jornal é a forma que Umberto Eco usou para criticar a política italiana que nasceu dali, tão corrupta ou mais que a anterior, e a crise econômica que se acentuou de uns anos para cá no país. Enfim, como dissemos no Brasil: tudo acabou em pizza, mas Eco encontrou uma analogia mais interessante. O nome do jornal em que colona trabalha, nunca chega a ser lançado. É o amanhã que nunca vem.
Considerações finais
Por ser uma estória curta, (são duzentas páginas em fonte grande) não há muito espaço para o desenvolvimento do protagonista, contudo está longe de ser uma estória rasa, como já vi em algumas resenhas, pois o texto tem várias camadas que remetem a história italiana desde a segunda guerra até o período de Sílvio Berlusconi, que podem escapar ao leitor despreocupado brasileiro. Número Zero parece ser um livro simples mas esconde muito elementos não-ditos, assim como as notícias de um jornal.
Separei uns trechos interessantes, que se passam na redação do Amanhã.
— A questão é que os jornais não são feitos para divulgar, mas para encobrir as notícias.
— Não são as notícias que fazem o jornal, e sim o jornal que faz as notícias.
— Os jornais ensinam como se deve pensar…as pessoas não sabem no início que tendências têm, depois nós lhes dizemos e elas percebem que as tinham.
— Percebam que hoje, para contra-atacar uma acusação não é necessário provar o contrário, basta deslegitimar o acusador.
— Não é necessário inventar notícias, é só requentar.
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