quarta-feira, 20 de julho de 2016

Resenha #33 - A linha tênue (Rubem Cabral)

[SEM SPOILERS]
A linha tênue (2014) é um livro de contos do autor brasileiro Rubem Cabral, lançado pela Editora Caligo. Os 29 contos curtos que o compõe abrangem gêneros da Ficção Científica, Fantástico, Terror, Sátiras, Steampunk e afins. Alguns oferecem  doses de sangue, de erotismo, viagens insólitas e/ou de mistério. Falando assim pode parecer uma grande salada sem sentido mas não é nada disso. Existe uma característica predominante no livro são as "quebras de paredes" entre os personagens e o leitor. São pontos de vista inusitados, personagens que falam com leitores, personagens que sabem que são personagens podem aparecer sem aviso durante a leitura.

O grande barato da obra não é apenas encontrar contos ótimos em meio a uma seleção de criações do autor, mas a surpresa que se tem a cada nova estória que se começa. Os títulos - acredito que tenha sido proposital - não ajudam muito a prever sequer o gênero de estória que virá pela frente. Isso incrementa a experiência de leitura de cada conto e dá força ao conjunto como algo maior que a soma das partes.

A escrita de Rubem mostra domínio da história curta, pois não há rebarbas nas estorias, cada linha contribuí para o desfecho do conto. O ponto forte são os enredos surpreendentes e a qualidade da escrita mantém o equilíbrio do início ao fim.

Como são muitos contos, para comentar isoladamente, vou escolher meus cinco preferidos e quem já leu o livro pode comentar os seus também:

Revolta nas páginas 34, 35 e 36: Ao mostrar um príncipe genérico de estórias de Fantasia conversando com os "personagens secundários, os sem nomes, os esquecidos, que aparecemos e sumimos sem maiores explicações",  que sabem que são personagens, dão uma amostra bem humorada da metalinguagem que pode aparecer em qualquer conto. Considerei uma crítica ao mais-do-mesmo na literatura de Fantasia, muito referenciada as culturas do norte do globo, mesmo quando feitas em terras brasileiras. É um ótimo conto para apresentar o livro a quem não o conhece.

Mil-folhas: Pessoas que escrevem sobre pessoas num única aflição. Grafias, bebidas e formas diferentes de colocar no papel a mesma dor. Este conto também usa a metalinguagem e a edição (ao colocar cores e grafias diferentes para cada personagem) contribuiu muito para o clima imersivo do conto. 

A maloca de Jaçanã: aparenta ser uma estória de Samba mas que ganha contornos fantásticos. Destaco os personagens Adorniran Barbosa e os amigos que ele faz quando fica sem onde morar, pois são os que mais lamentei deixá-los quando o conto acabou.

O bom provedor: acreditei ser uma estória de aliens, bem ao gosto de ufologistas, mas me agradou bastante por tomar um rumo diferente sem querer dar explicações do tipo "eu quero acreditar". Um dos finais, mais impactantes sem usar da metalinguagem.

Palimpsesto: É aquele tipo de conto que de te passa a perna e deixa um sorriso de satisfação mesmo antes da conclusão da investigação da morte da família Mendes Martins.

A edição lida para a resenha é a da Editora Caligo que fez um trabalho muito bonito com a arte na capa pois é um desafio pensar uma imagem que expresse bem tamanha variedade de assuntos, e a raposa ganhando vida como que numa única pincelada ficou excelente. Alguns contos pela metalinguagem receberam o devido tratamento, principalmente no conto Mil-folhas que pedia várias grafias. Coisa que exige atenção ao trabalho do autor.

2 comentários:

  1. Olá. Li esse livro também, há cerca de um ano. Igualmente, gostei muito! Cada conto é uma surpresa, seja pelo tema, seja pela maneira de contar a história.
    Gostei também de sua resenha: conta bastante, mas sem estragar o prazer que quem ainda não leu.

    Gosto dos contos citados, mas meus preferidos foram outros:

    (1) Vésperas de Natal em Páscoa - personagens bem desenhados e, caramba, que final!
    (2) Além da Fábrica - adoro distopias!
    (3) O Dia da Inclusão - adoro distopias (2)!
    (4) Esperando o que vem depois - adorei esse conto cheio de absurdo.
    (5) Aconteceu na Lapa - uma tremenda viagem lisérgica, não?

    Abraços!

    Wilson

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